sexta-feira, 19 de novembro de 2010

A influência da televisão no esporte: o caso do futebol americano

RESUMO: Decidir um lance duvidoso pela imagem de uma televisão. Esse assunto polêmico ganha força com o aumento da influência dos meios de comunicação de massa nos esportes. A presença da TV transformou o esporte em um espetáculo de consumo, criando mitos, ídolos e heróis. Entretanto, até que ponto ela deve ser usada para decidir lances polêmicos? No futebol americano a TV é utilizada e já faz parte do jogo. A experiência americana pode ser tida como exemplo para os outros esportes, ou essa presença só torna o esporte cada vez mais midiatizado e longe do espectador?

PALAVRAS-CHAVE: esportes; televisão; espetacularização; futebol americano.

Introdução
O esporte é hoje uma manifestação sociocultural importante no mundo. Ele evoluiu tornando-se elemento de democratização e agregador de países e povos. Essa evolução foi acompanhada pela mídia que enxergou no esporte um dos grandes filões para gerar consumo, ideias e paradigmas. O sucesso de alguns eventos esportivos passou a depender exclusivamente da presença dos meios de comunicação de massa. A televisão passou a ter papel determinante até na formulação de algumas regras de esportes, para se adaptarem às grades de programação e por consequência ao consumo. As imagens se tornaram os grandes aliados na produção de atletas heróis e exemplos a serem seguidos pelos apaixonados por esportes.
Com essa indústria do esporte consolidada, a televisão passou a interferir em alguns esportes. As super imagens das modernas câmeras passaram a ser tira-teimas de polêmicas e dúvidas em lances do esporte. O futebol tem se mantido bem longe dessa tecnologia e recebe várias críticas por isso. O futebol americano, objeto de nosso estudo nesse artigo, se rendeu totalmente à TV. Toda e qualquer dúvida nesse esporte é tirada com as imagens. Uma questão polêmica que nos faz pensar até que ponto a televisão pode interferir no jogo.

O que é o futebol americano?
O futebol americano é uma derivação do rugby, primo do futebol. Nos EUA ganhou novas regras que foram escritas em 1876 e aos poucos foi se distanciando do rugby e se adaptando à cultura do país onde passou a ser praticado. Uma diferença básica é que no futebol americano, quando algum jogador é derrubado o jogo é paralisado, no rugby não. As jogadas são mais elaboradas, planejadas e mais estratégicas do que no rugby. Cada equipe possui um time para atacar e um time para defender. A equipe de defesa é composta por 11 jogadores e a de ataque também. Existem as equipes especiais que entram em campo para os chutes. Existe um jogador que tem a única função de chutar a bola, chamado kicker. Cada time conta com 53 jogadores em seu elenco. Durante a partida, cada equipe pode utilizar 45 atletas, mas efetivamente apenas os 22 (11 do ataque e 11 da defesa) participam dela. Não há limite de substituições durante a partida.
O fundamental do jogo é ganhar jardas dentro do campo adversário. O campo é dividido em cem jardas. Cada equipe tem 4 tentativas de alcançar dez jardas, se não conseguir, a posse de bola passa para o outro time. Quem conseguir chegar até o final do campo do adversário ganha seis pontos com direito a um ou dois pontos de bonificação, chamado extra point. Se a estiver na quarta tentativa e longe da área final adversária pode tentar chutar a bola entre o “Y”, que fica no campo adversário e caso a bola passe entre as traves o time ganha 3 pontos. O jogo é dividido em 4 quartos de 15 minutos cada um, com paralisação do cronômetro em algumas situações.
É um jogo extremamente estratégico com ênfase no jogo de equipe, onde alguns jogadores têm em campo a única função de defender seu companheiro, para que ele possa correr, receber o passe ou fazer o passe. O jogador responsável pela escolha das jogadas de ataque é o quarterback, que possui um rádio de comunicação com o técnico de ataque. O técnico de defesa é outro, e os dois são coordenados pelo técnico principal.
Assim como em todos os esportes em seu início, a primeira transação comercial do futebol americano foi feita por preços mínimos: 10 dólares. Muito diferente dos 12 milhões por temporada de alguns astros da NFL (National Football League) ganham atualmente. Em 1897 o primeiro time formado apenas por profissionais disputou um campeonato: era o Latrobe Athletic Association. Hoje em dia, a NFL, liga profissional de futebol americano conta com 32 franquias que movimentam bilhões no mercado estadunidense, divididos em 2 grandes conferências: a AFC e a NFC.
O esporte, ao contrário do que muitos pensam, é simples e emocionante. Diferente da primeira impressão tida no Brasil, de que era complicado e chato. Ficou famoso pelas pancadas, pelas lesões e pelo alto vigor físico de seus atletas que, em vários casos, se assemelham a halterofilistas, tamanha sua massa muscular. Os uniformes e as proteções, aliadas às caras pintadas dos jogadores fazem uma associação a gladiadores que vão para um campo de batalha. Contudo, é um dos esportes mais leais, por causa da presença e uso da TV. Qualquer tipo de ação ilegal: chute, puxão de camisa, soco e etc é visto e punido com 10, 15 ou 20 jardas de penalização, o que pode decidir um jogo ou, se a infração for mais grave, causa a suspensão de futuros jogos e multas.
Para não perder nenhum desses detalhes, o futebol americano tem uma equipe de nove árbitros no campo que marcam as faltas apitando e ainda lançando um lenço (flag) amarelo no campo. Eles são divididos em: árbitro principal, 3 auxiliares, um supervisor de linha, um de campo, um de fundo, um de linha e um lateral. Além desse verdadeiro “arsenal” de “homens da lei”, temos os árbitros que serão objeto maior de nosso estudo nesse artigo: os juízes de TV. São os árbitros que ficam junto da cabine de transmissão da televisão e do telão do estádio, conferindo pelas imagens se o lance foi legal ou não.
É um esporte tipicamente americano, para eles o football é esse e o nosso conhecido futebol é chamado de soccer. No início dos anos 90 ultrapassou o baseball como o esporte mais popular do país. A televisão teve um papel fundamental para o futebol americano assumir essa liderança. Com o maior número de câmeras e a melhor qualidade das imagens o esporte se tornou um espetáculo maior do que o baseball.
Qualquer lance do futebol americano reprisado pelas várias câmeras no estádio em câmera lenta se tornou mais atrativo frente ao telespectador do que as rebatidas, corridas ou homeruns do baseball.
Na divisão entre os esportes proposta pelo pesquisador Manoel Tubino (2007), o futebol americano aparece como esporte de identidade cultural, assim como a capoeira no Brasil. É um esporte que, apesar do avanço e da proliferação para outros países por causa das transmissões esportivas, é tipicamente americano. Ele reflete os maiores valores da sociedade dos EUA: conquista com sucesso o achievement, trabalho em grupo, o orgulho cívico e eficiência. Vemos também em vários filmes que os chamados “populares” nos colégio e faculdades são os jogadores de futebol americano com suas jaquetas características, as meninas mais belas são as cheerleaders e os losers são aqueles que não têm aptidão para esse esporte, que não são tão belas ou não têm desenvoltura para serem líderes de torcida. Assim como no Brasil, este esporte é a grande chance para alguns subirem na vida e saírem de uma classe mais baixa, juntamente com o basquete. Através dele, atletas conseguem boas universidades, e destacando-se, conseguem uma vaga em algum time da NFL, nunca mais preocupando-se com seu futuro econômino.
No Brasil, o futebol americano nunca teve o sucesso esperado, talvez porque como afirma DaMatta(1982) “cada sociedade que adotava o esporte, moldava – querendo ou não, sabendo ou não - a sua organização social e valores.” Mas hoje, várias ligas de futebol americano foram criadas no país.
Assim como na NBA – Liga de basquete profissional Norte-americana, o football tem uma gestão profissional, onde as equipes são de franquias que podem mudar de cidades e pertencem a milionários ou bilionários americanos, funcionando como grandes empresas. Um exemplo disto é o estádio novo do Dallas Cowboys, que custou 1 bilhão de dólares e é considerado e estádio mais moderno do mundo, demonstrando o grande volume de dinheiro gerado por esse esporte.
Outro exemplo disso é que a maior audiência da TV americana é a final do campeonato da NFL o chamado Superbowl, onde 30 segundos valem U$ 3 milhões. O Superbowl está entre os maiores eventos esportivos do mundo, ao lado das Olimpíadas e
da Copa do Mundo. Tudo dentro do esporte é vendido, qualquer intervalo, qualquer pedido de tempo. O salário anual do quarterback do Pittsburgh Steelers, Ben Roethlisberg, o famoso Big Ben para os americanos, chega aos US$ 27,7 milhões. No último dia 7 de fevereiro, o New Orleans Saints venceu o Indianápolis Colts por 31 a 17 conquistando seu primeiro Superbowl. O evento foi visto por 153,4 milhões de pessoas, tornando-se o programa mais assistido da História da TV americana. (NFL,2010)
Esses números impressionantes mostram, além da importância desse esporte na cultura americana, a influência da TV no futebol americano. O futebol americano simboliza muito a cultura norte-americana e a televisão se encarregou de espetacularizá-lo e vendê-lo como uma grande mercadoria, como mostram os números acima.

A espetacularização do esporte
A mídia, cada vez mais influencia o espetáculo esportivo. Antes, um torcedor precisava ir até à banca de jornal ou ir ao estádio para saber o resultado do jogo. Com o rádio, depois a televisão e hoje a internet, ele não precisa sair de casa para acompanhar seu esporte preferido. A presença da televisão é fundamental para o sucesso do esporte. É o que afirma NUZMANN (1996:15), presidente do Comitê Olímpico Brasileiro (COB)
...o Presidente do Comitê Olímpico Internacional COI, Marques Juan Antônio Samaranch ressaltou que os esportes que não se adaptarem à televisão estarão fadados ao desaparecimento. Da mesma forma, as televisões que não souberem buscar acesso aos programas esportivos jamais conseguirão sucesso financeiro e de público.
A televisão procura o tempo todo espetacularizar suas imagens para vendê-las e isto não é diferente com o esporte. Dessa forma o esporte passou a ser uma mercadoria e se tornou um show de entretenimento. A partir desse momento podemos analisar e entender qualquer atleta como um produto que pretende ser vendido, que quer ser visto como o melhor, e que todos, para serem tão bons quanto ele, devem ser como ele. Surgem assim, os grandes astros e celebridades do esporte: o “fenômeno”, o “rei”, o “imperador”, o “atleta do século”, o maior de todos os tempos em todos os esportes.
Dessa forma, o espetáculo, como parte da sociedade, de acordo com o cientista Guy Debord (2006), para ser compreendido na sua totalidade, precisa ser percebido
numa relação social entre pessoas, midiatizada por sons e imagens. Debord ainda afirma que, à medida que o consumo aumenta, aumenta também o número de espetáculos, o que nos coloca na “Era do Espetáculo”. A sociedade hoje preza muito mais a imagem, vale mais parecer do que ser.
“E sem dúvida o nosso tempo...prefere a imagem”a coisa, a cópia ao original, a representação à realidade, a aparência ao ser...Ele considera que a ilusão é sagrada, a verdade é profana. E mais: a seus olhos o sagrado aumenta à medida que a verdade decresce e a ilusão cresce, a tal ponto que, para ele, o cúmulo da ilusão fica sendo o acúmulo do sagrado” (DEBORD, 2006, p.13)
Com a espetacularização do esporte, os salários dos jogadores se multiplicaram na mesma proporção que a evolução da cobertura e o número de câmeras analisavam cada imagem dos atletas. O aumento da audiência trouxe mais telespectadores do que espectadores ao mundo esportivo. Esse fator tornou eventos mais televisivos e mais preocupados com quem acompanha, sob a ótica dos meios de comunicação, do que quem acompanha o esporte ao vivo e a cores no estádio ou ginásio.
Foi o que aconteceu com o vôlei. Antes disputado em “sets” com vantagem e somente o “set” decisivo sem vantagem. A vantagem significava que somente quem efetuasse o saque, poderia marcar pontos. Isso fazia com que uma partida durasse horas, não se encaixando nas grades de programação televisiva, pois o jogo tanto poderia terminar em uma hora quanto durar mais de três. Independentemente se o espectador acompanhasse um grande jogo de 4 horas ou 2 horas, a visão de consumo do produto mostrado ao telespectador fez o esporte se adaptar à televisão. Assim como o basquete, que recentemente adotou quatro tempos, como no basquete profissional americano, para poder vender mais intervalos. O futebol também sofreu algumas alterações, como o gol marcado fora de casa como critério de desempate em competições no estilo mata-mata. Embora afirmem que a regra é para incentivar as equipes a marcarem gols fora de seus domínios, ela foi feita para dificultar ao máximo uma chance de prorrogação e disputa de pênaltis, o que atrapalha toda a grade de programação. Portanto, a presença decisiva da televisão para o sucesso e o esporte como negócio é mais do que uma constatação: é uma lei.
A condição pós-moderna conferida ao esporte atual pode ser justificada pela relação de dependência estabelecida com os meios de comunicação de massa e o conseqüente ajustamento de sua prática em função das exigências e necessidades desses meios. (RUBIO, 2002, p.6)
Dentro dessa “lei” e imposição do mercado em vender imagens e espetacularizá-las a todo momento, a TV, com toda sua tecnologia, passou a ir além do olho humano. O grande número de câmeras dispostas em um evento esportivo passou a nos mostrar dois tipos de jogos: o visto ao vivo e o visto pela tela.
Supressão dos tempos mortos, inserção de sequências pré-gravadas, entrevistas ao vivo, focalização sobre os atletas vedetes, replay das imagens decisivas, tomadas múltiplas e diferenciadas em vários planos os replays e as diferentes velocidades conferem uma força estética e sensitiva, ao mesmo tempo que hiper-real, á imagem esportiva. Acabaram-se as retransmissões uniformes: a cobertura deve ser agora polimorfa e o estilo ritmado (LIPOVETSKY e SERROY, Apud BEDENDO, 2010)
O pesquisador Ricardo Bedendo afirma que a dependência do olhar/byte chega ao ponto de assistirmos a um jogo na arquibancada esperando o replay e a câmera lenta tirar a dúvida em um lance polêmico. “o cardápio oferecido por essas teles altera radicalmente as transmissões e consequentemente os comportamentos de todos os envolvidos no jogo, como imprensa, atletas, dirigentes, árbitros, comissões julgadoras e instituições promotoras” (BEDENDO,2010) A televisão encontrou no esporte espetáculo sua maior consagração, reescrevendo o espaço-tempo de competições de alto nível.(LIPOVETSKY e SERROY, Apud BEDENDO, 2010)
Não é difícil observar durante os grandes eventos esportivos como NBA e a Copa do Mundo FIFA, que atletas se olhem nos telões espalhados no estádio ou no ginásio após um lance para saber como “ficou na foto”. E não só os jogadores se valem dessa visão de telespectador, mas também os jornalistas presentes no estádio, congelando e repetindo imagens para tirarem a dúvida da sua primeira impressão no lance. Os dirigentes passaram a se queixar com frases típicas como “todos vocês viram na televisão”. Os Tribunais de Justiça Desportiva também usam as cenas para punir o jogador e imagens para identificarem torcedores que não se comportam dentro dos estádios ou para punirem clubes.
Todos esses efeitos da televisão dentro do esporte são notórios. Mas, quando a televisão, além de imortalizar os ídolos do esporte pelas imagens, passa a entrar dentro dele, definindo se um lance foi legal ou não? Em alguns esportes o recurso tecnológico já tem essa influência e em muitos casos o voto final. No Tênis, um atleta pode desafiar a arbitragem para saber se uma bola foi dentro ou foi fora, e nessa hora a tecnologia entra em campo para tirar a dúvida. No Basquete alguns lances são vistos no telão para analisar melhor se o cronômetro zerou antes ou não. No Turfe, Atletismo e Fórmula 1 temos uma máquina de alta precisão na linha de chegada que decide quem chegou em primeiro lugar. Mas de todos os esportes não existe nenhum que a televisão tenha tanta influência quanto no futebol americano.
Este esporte se tornou o mais popular dos EUA desde os anos 90, com os times universitários, que têm uma liga televisionada e com grandes números de audiência. Isso mostra a forma como a TV se incorporou a este esporte e passou a ser parte integrante do mesmo. Mas engana-se quem pensa que a presença da TV retira os torcedores do estádio. Em qualquer jogo, seja universitário, colegial ou na liga profissional é raro ver estádio vazios.

A TV entra em campo como juiz
Fica bastante claro que no esporte deixamos de ser espectadores para sermos telespectadores e é no futebol americano da NFL que constatamos o maior efeito da TV dentro de um esporte. Além de transformar as imagens, os tackles e os passes em imagens espetaculares, não existe nenhum esporte que esteja tão aliado à TV quanto o futebol americano.
No futebol foi amplamente discutida a tecnologia durante a última Copa. Os erros de arbitragem como o gol legal de Frank Lampard no jogo contra a Alemanha, quando o jogo estava 2 a 1 para os alemães. O uruguaio Jorge Larrionda e seu auxiliar não viram o que as 32 câmeras espalhadas no estádio mostraram para todos os telespectadores do mundo: a bola entrou. Assim como o impedimento no gol Argentino contra o México, mostrado nas telas do estádio e o que levou aos mexicanos a mostrarem o imenso telão do estádio como argumento maior de sua reeinvindicação.
Além disso a Irlanda já tinha sido eliminada da disputa da fase final do Mundial na África do Sul por uma mão absurda do francês Thierry Henry. Todos esses lances inflamaram os comentaristas esportivos e envolvidos com futebol no mundo todo. O tema tecnologia no futebol ganhou força, como a implantação de um chip na bola, que também foi discutido. Mas, todas essas tecnologias, que fizeram parte da Copa do Mundo da FIFA, como jogos em 3D, supertelões nos estádios, jabulani, transmissões em HD, câmera superlenta com imagens espetaculares continuaram somente para os telespectadores em casa. Nada disso foi para dentro de campo.
Totalmente diferente do futebol americano. A TV funciona como juiz nesse esporte. Não existe nenhum esporte mais integrado com a televisão e seu show de imagens, que o futebol americano. O esporte conta com os seus 9 juízes dentro de campo. Qualquer tipo e falta, por mais longe do lance que ela ocorra é evidenciada pelas imagens no telão do estádio na hora, tirando qualquer tipo de dúvida dos times e do espectador que se torna telespectador quando está no estádio, pois tira seus olhos do campo para direcioná-los às grandes telas que vão decidir o lance. Uma comissão de juízes assiste ao jogo dentro da cabine de transmissão de TV voltando os lances, congelando as imagens e frisando o lance polêmico. Qualquer falta ou lance ilegal é visto pelos árbitros ou pelas câmeras e imediatamente o jogador infrator é punido.
É impressionante assistir uma partida de futebol americano pela TV, pois alguns lances que os árbitros marcam a falta são quase imperceptíveis e apenas com o recurso da TV é possível vê-los. No jogo San Francisco 49ers e New Orleans Saints, que vamos analisar neste artigo, a TV foi utilizada para decidir um lance decisivo que empatou o jogo há 1 minuto e 19 segundos do fim. O time de San Francisco marcou o touchdown, jogada com o maior número de pontos no esporte. Quando se marca o touchdown pode-se decidir se a equipe vai chutar a bola no “Y” e conseguir 1 ponto extra ou tentar 2 pontos extras, mas através de uma jogada sem chute, o que é mais difícil. Como o jogo estava 22 a 20 para os Saints, que teria a posse de bola até o final do jogo e apenas ia esperar o jogo acabar, os 49ers tentaram a conversão de 2 pontos para empatar o jogo, se defender até o final e ir para a prorrogação. No momento do lance, os juízes invalidaram a tentativa, pois afirmaram que o jogador do time de San Francisco não
estava dentro da endzone, portanto toda a equipe de New Orleans comemorou a vitória e a boa jogada defensiva que impediu o adversário de receber a bola dentro da zona final. O técnico do San Francisco desafiou a arbitragem pedindo a análise pela televisão. Depois da imagem ser mostrada no telão e ficar comprovado que o atleta estava com os dois pés dentro da zona e tinha o controle da bola a TV mudou o rumo do jogo. O juiz oficial ligou o microfone, ligado ao alto-falante do estádio e anunciou, para todos os presentes como espectadores que já tinham visto como telespectadores nos telões no estádio, que o lance foi legal e que os 49ers tinham conseguido os 2 pontos, para delírio total dos torcedores no estádio. No pouco tempo que faltava os Saints ainda conseguiram marcar um Fieldgol e venceram a partida.
Isso nos traz um grande tema que é a presença da imagem como juíza nos esportes. A sociedade americana é amplamente incorporada à mídia e aos seus apelos de consumo e trata todos os esportes como negócio. O erro de arbitragem é condenado por atrapalhar não só o esporte, mas todo um investimento de uma temporada à mercê das mãos, ou melhor, dos olhos de um juiz. Deu certo no futebol americano, e só pode ser executado nos grandes eventos, pois a TV é parte integrante do esporte e sem ela não é possível solucionar as dúvidas e questões do jogo. Dessa forma, obriga a televisão a estar presente com todo seu aparato em qualquer jogo, seja ele da liga profissional NFL, seja ele da liga universitária NCAA, tornando-o um espetáculo e aumentando o número de pessoas que vão acompanhá-lo e consequentemente sua popularidade.

Considerações finais
A questão é que a televisão passou a ser decisiva ao transformar os esportes em espetáculos. Seu papel para aí ou ela pode realmente entrar em campo como no futebol americano, sendo a juíza ou influenciando totalmente a partida?
A polêmica que tratamos no artigo deve ser muito debatida. A televisão deve realmente entrar dentro do jogo esportivo como no futebol americano? O olho humano não consegue mais acompanhar o que acontece em campo e precisamos do olhar byte para esclarecer as dúvidas? Até que ponto essa tecnologia estraga o espetáculo esportivo? É melhor o debate sobre o erro do juiz? Ou é melhor a justiça através das
imagens para decidir se a bola entrou ou não, se foi falta ou não? Abordamos mais o futebol, por ser o esporte onde a tecnologia tem menos influência no resultado, mas e nos outros esportes, até que ponto a TV, além de mostrar um show de imagens ao telespectador, deve ser juíza em lances polêmicos?
Neste caso, a democratização do futebol, que qualquer amante dele pratica pelo mundo seria diferente do praticado pelas estrelas, pois não teríamos câmeras em todos os estádios para tirar todas as dúvidas. A imagem realmente vale mais? No futebol americano, com toda a cultura americana envolvida, a experiência dá muito certo. A cultura dos EUA é totalmente televisiva, tratando o esporte como negócio e de forma extremamente capitalista. Assim, nunca deixariam a decisão de um campeonato que movimenta bilhões em cima de uma pessoa, isso não passa credibilidade no mundo de investimentos. Na sociedade do espetáculo, de telas e bytes que transformaram o esporte no maior fenômeno sócio-cultural do mundo, devemos trazer toda a tecnologia para dentro de campo como no futebol americano ou mantê-la longe das decisões como no futebol?
Uma vez que o futebol, como todos os e outros esportes, se tornou negócio, quanto menor a chance de erro, melhor para quem investe. Como quem investe manda no esporte, eu acredito que sim, é uma questão de tempo para que a FIFA sofra pressões de seus patrocinadores e o futebol comece a introduzir a tecnologia para tirar a dúvidas de lances polêmicos.

REFERÊNCIAS
BAUDRILLARD, Jean. Tela Total : mitos e ironias na era do virtual e da imagem. Organização e tradução de Juremir Machado da Silva. Porto Alegre: Sulina, 1999.
BEDENDO, Ricardo. A Copa dos campos e a Copa das telas: comunicação, tecnologia e as novas interpretações do football. 1XXXIII Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Caxias do Sul, RS, 2010.
BETTI, Mauro. A janela de vidro: Esporte, televisão e educação física. 3.ed. Campinas: Papirus, 2004.
DA MATTA, Roberto et. al. Universo do Futebol: esporte e sociedade brasileira. Rio de Janeiro: Pinakoteque, 1982
DEBORD, Guy. A sociedade do espetáculo. Traduzido por: Estela dos Santos Abreu. 7. impressão. Rio de Janeiro: Contraponto, 2006.
FALK, Gerhard. Football and American Identity. New York; The Haworth Press, 2005.
FRONTELMO, Paulo Antônio Coelho Soares; RIBEIRO, Carlos Henrique de Vasconcellos. Futebol americano no Brasil: estratégias e limitações no país do futebol. UNISUAM, 2006. Disponível em: http://www.efdeportes.com/efd102/futebol.htm Acesso em: 22set.2010
LIPOVETSKY, Gilles; SERROY, Jean. A Tela Global: mídias culturais e cinema na era hipermoderna. Tradução de Paulo Neves. Porto Alegre: Sulina, 2009.
NFL. Chronology of Professional Football. Disponível em: http://www.nfl.com/ Acesso em 22set.2010.
NUZMANN, Carlos Artur. A importância do marketing esportivo no esporte. Seminário INDESP de Marketing Esportivo. Ouro Preto: INDESP, 1996.
RUBIO, Katia. O trabalho do atleta e a produção do espetáculo esportivo. Scripta Nova, Revista Electrónica de Geografía y Ciencias Sociales, Universidad de Barcelona, Vol. VI. nº 119 (95), 2002.
SANTOS, Nei Jorge Júnior. Espetacularização esportiva na TV: ações e desafios à educação física escolar. Universidade Gama Filho, 2007. Disponível em: http://www.efdeportes.com/efd111/espetacularizacao-esportiva-na-tv.htm Acesso em: 22set.2010
TUBINO, Manoel Jose Gomes; TUBINO, Fábio Mazeron, GARRIDO, Fernando Antônio Cardoso. Dicionário Enciclopédico Tubino do Esporte. Rio de janeiro: Senac, 2007.

terça-feira, 21 de setembro de 2010

A Seleção Brasileira como propaganda do Governo. Getúlio em 1938 e os militares em 1970

Resumo

Em ano de Copa do Mundo, quando o brasileiro fica com o nacionalismo aflorado e as ruas ganham o verde e amarelo, é pertinente discutir e analisar como essa onda ufanista começou. O esporte mais popular do mundo ganhou contornos de mania nacional e foi explorado pelos políticos em diferentes épocas. O trabalho mostra como o futebol foi usado como propaganda de governos ditatoriais e como se construiu uma identidade nacional e uma coletividade através dele. Como o rádio ajudou a formar essa identidade com o governo de Getúlio Vargas em 1938 e como a televisão consolidou esse esporte como elemento de patriotismo com os militares em 1970.

Palavras-chave: futebol; seleção; ditadura; propaganda.

Introdução
Quando assistimos a um jogo da Seleção Brasileira de futebol, vemos na camisa canarinho um dos símbolos nacionais. É como se ela se tornasse um símbolo oficial, uma maneira de demonstrar que ali existe um brasileiro, seja na torcida ou em campo, como se ele empunhasse o brasão da república ou a bandeira nacional. No exterior o Brasil é reconhecido pela camisa amarela em qualquer lugar. Toda essa identificação do povo brasileiro com a seleção nacional de futebol deve-se à forma com que esse esporte se enraizou na cultura do país e fez com que falássemos do esporte bretão como a grande paixão nacional. Seja pela diversidade étnica do país ou pela forma democrática que o esporte apresenta, o seu fator de integração nacional em torno de um mesmo ideal (o sucesso da seleção) mostra a força que a idolatria por um time modifica e agita um país inteiro.
É claro que toda essa idolatria leva a uma alegria coletiva no caso de uma vitória e de uma tristeza geral quando a seleção é derrotada. É como se o país ganhasse ou perdesse junto com os jogadores. Dessa forma, esse poder de tornar o país mais alegre com um título fez com que governos passassem a explorar a seleção, associando a vitória a um momento bom para o governante, como se ele tivesse entrado em campo junto com os jogadores. Essa idéia de esporte junto ao Governo começou no Brasil com Getúlio Vargas, durante o Estado Novo. E foi explorada por todos os governantes que tiveram durante seu mandato um título brasileiro da Copa do Mundo. Este artigo vai abordar como duas ditaduras usaram o futebol para se promover, fazer propaganda do regime e encher as páginas dos jornais de assuntos que nada tinham a ver com o que acontecia nos porões da ditadura.

Copa de 1938 – “Quando perde a seleção, perde o país.”
O governo Vargas no Brasil foi responsável pela transição da população do campo para a cidade. A industrialização e a urbanização de forma acelerada concretizou-se nesta época. Após a crise de 1929, que culminou com a quebra da bolsa de valores de Nova York, o principal produto de exportação brasileira, o café, que era a base da nossa economia e mantinha a base política de Minas Gerais e São Paulo no poder ruiu. A derrota da oligarquia dos coronéis foi inevitável e dentro de um clima de nacionalismo que surgiu na Semana de Arte Moderna de 1922 sugeria um país diferente. Os valores da pátria estavam no auge, sentimentos nacionalistas e a deglutição cultural pregavam um país com orgulho próprio, que precisava se desprender do seu passado, que não dependesse externamente de outros países na economia, que tivesse uma valorização e a consolidação de uma cultura nacional. Era preciso aceitar o “novo” brasileiro que nascia junto com a saída do campo e a ida para a cidade.
Esse “novo” brasileiro trabalhava nas fábricas e morava na cidade. Os ingleses que vieram para o Brasil para implantar as fábricas traziam também o gosto pelo futebol como tradição dos operários ingleses. Foi nesse momento que o esporte, até então elitista, se torna popular e capaz de mobilizar massas. O futebol vai ser usado para criar uma nova “nação”, por atrair grande público, e desta forma sair do amadorismo e se tornar profissional e acima disso, uma instituição nacional.
Foi nos anos 30 com Getúlio que se instaurou a profissionalização no futebol. O momento político e cultural do Brasil instigava o trabalhador assalariado: “As leis trabalhistas são de harmonia social” – como afirmava o próprio Getúlio. Além disso, as elites, baseadas na tradição européia, pregavam o amadorismo, como uma distinção entre eles e as camadas mais populares. Portanto, numa atitude mais populista do que visionária, que pregava as “verdadeiras raízes brasileiras” e mais para controlar, disciplinar e sindicalizar os jogadores para o que já se enxergava como grande manifestação popular da época passou a se ter jogadores profissionais, culminando com a criação já em 1941 do Conselho Nacional do Desporto.
Apesar da resistência de alguns segmentos mais conservadores, o crescimento da ideologia da construção de uma identidade de povo e de nação, fundada no imaginário do mulato, colabora para a profissionalização. A influência negra e indígena, que no início do século era considerada a negação na identidade Brasil, é agora vista como o fundamento de uma ideologia nacional, a brasilidade. Aliás, uma cultura política que não ficou restrita ao período Vargas (1930 a 1945), mas que perpetrou também a fase nacional-populista subseqüente. (RIBEIRO, 2003)

Da mesma forma com que o futebol crescia como cultura popular, o rádio era o veículo de comunicação de massa mais poderoso para unir um país tão grande tanto no seu território quanto em sua diversidade. Getúlio percebeu que a união de futebol e rádio era inevitável e usou um para difundir suas idéias de nacionalidade através do outro.
O Brasil entra nos anos 30 diante de um grande fenômeno de cultura de massas. O rádio é apresentado como um dos instrumentos que vai promover a integração nacional e o futebol, que vinha se tornando mania nacional, poderia perfeitamente contribuir com isso também. A política, em toda essa história do desenvolvimento do rádio e futebol no país, se aproveitou muito da paixão do torcedor.(...) Enquanto um, o rádio, surgiu como primeiro veículo de comunicação de massa, o outro se transformou no esporte que maior paixão despertou no brasileiro. Ambos nasceram no berço das elites, mas logo se transformaram em mania nacional, com base na emoção e criação de ídolos. (GUERRA,2006)

O rádio não só levou o futebol para todo canto do país, mas realizou um “casamento perfeito” com esse esporte. O rádio leva a vibração, emoção de dentro do campo para o torcedor, pela narrativa do locutor. Em 1932, o rádio vai receber um incentivo fundamental para ganhar de vez a popularidade: através do decreto 21.111 foi autorizada a propaganda no rádio. Esse meio eletrônico vai se incorporar à sociedade brasileira e principalmente ao futebol como parte integrante do mesmo. Não é à toa que os grandes ídolos nacionais ganharam destaque através da narrativa radiofônica e os torcedores vão ao estádio ouvindo o rádio, ou assistem pela televisão com o áudio do rádio.
Getúlio soube usar esses dois pilares a favor de seu governo. Criou, através do DIP (Departamento de Imprensa e Propaganda), a Rádio Nacional que levava jogos dos times cariocas para todo o brasil. Seus discursos para os trabalhadores nacionais eram transmitidos pelo rádio criando uma identidade nacional através do veículo; em todo o país se ouvia o mesmo jogo e o mesmo discurso.
Os anos 30 são um momento decisivo na relação entre o futebol e a sociedade brasileira.Enquanto o meio político-cultural começa a redefinir as concepções acerca do ‘nacional’, a popularidade do futebol é impulsionada tanto pelo desenvolvimento do rádio como meio de comunicação de massa quanto pela oficialização do profissionalismo dos jogadores, fato este que transforma o jogo em trabalho. O futebol, assim, estabelece-se como um meio de integração e ascensão sócio-econômica para as camadas populares – historicamente excluídas –, bem como torna-se um dos elementos que viriam a caracterizar a identidade nacional brasileira (FRANZINI, 1997).

Inspirado no sucesso do fascismo italiano de Mussolini na Copa de 1934, onde o Dulce usou a Copa descaradamente como propaganda de seu regime, enaltecendo a disciplina e eficiência como fator de superioridade nacional, e Hitler nas Olimpíadas de 1936 em Berlim que só não conseguiu o sucesso pretendido porque um negro americano chamado Jesse Owens se encarregou de provar ao Fuher que a raça ariana não era soberana, Vargas seguiu os passos e decidiu que o time de futebol do Brasil em 1938 seria uma propaganda de seu regime e do seu projeto de coesão social. Para tal designou um dos seus homens de confiança para ser o chefe da delegação do Brasil, Lourival Fontes, para que nada fugisse ao seu controle. Dentre algumas de suas atitudes, Lourival recomendava aos jornais que parassem de criticar a seleção. Algumas preleções do time eram feitas ao lado da bandeira nacional, não foi á toa que o time brasileiro derrotado pela Argentina no Sul-Americano de 1937 foi recebido como soldados que voltavam de uma batalha.
Vargas decidiu, através da CBD, que Alzira Vargas, sua filha, seria a madrinha da Seleção Brasileira. Incentivadas pelo governo, as autoridades locais dispensavam os trabalhadores nos dias de jogos do Brasil. Pela primeira vez uma Copa foi transmitida ao vivo pelo rádio. Todos iam acompanhar o jogo em casa ou pelos alto-falantes espalhados nas praças, ouvindo a mesma narração que o presidente ouvia em sua casa com a esposa e a “madrinha” da seleção, criando uma coletividade, todos torcendo pelo mesmo ideal: a seleção.
Uma vez o futebol sendo popular, ia ao encontro das pretensões governamentais do presidente Getúlio Vargas em transformá-lo em um elemento de identificação nacional. O objetivo por parte do governo caminhava no sentido de associar elementos típicos do que se entendia ser uma cultura popular ao que supostamente haveria de mais peculiar no brasileiro, bem como instigar neste um sentimento de orgulho patriótico. O futebol já podia ser entendido como popular e mobilizador antes da década de 30; o que aconteceu a partir do governo de Vargas foi a utilização deste esporte de intenso apelo junto ao povo pelo Estado como meio para que se atingisse “as massas”, com a nítida posição do governo em encampá-lo e institucionalizá-lo (FRANZINI, 1997).

Getúlio acreditava que o time sairia campeão dessa copa e que isso seria fundamental para concretizar sua política de nacionalização e de recuperação da auto-estima do povo brasileiro. Apostava em craques com Domingos da Guia e Leônidas da Silva para voltar da França com a Jules Rimet. A camisa ainda não era a amarelinha, era branca. Foi a primeira vez que se formou uma verdadeira seleção do país, foram convocados os melhores atletas e as brigas entre cartolas, como em 1930, foram sucumbidas com o peso de Vargas e seu homem de confiança dentro do time.
Da madrinha da seleção Alzira Vargas, passando pelo embaixador brasileiro na França, por todas autoridades públicas que doaram dinheiro para a delegação, além dos empresários, das atividades econômicas privadas, nacionais ou estrangeiras, chegando ao mais simples torcedor. A nação, unida, mostrava-se de prontidão, atenta para enfrentar os inimigos que viessem pela frente; a unidade nacional construída a partir do futebol, revelava a força do Brasil, que manifestava-se apontando a total falta de temor diante de inimigos tão fortes. (NEGREIROS, 1998)

Os grandes astros do time eram negros, mostrando que o país estava encampando a idéia de aceitar suas raízes étnicas e que poderia vencer com o talento, com a maneira brasileira de jogar e não a européia. Esperava-se que o futebol brasileiro seria coroado nesta Copa, e a forma de jogar do brasileiro encantou a França. O Brasil passava a ser conhecido pelo seu mérito, por algo que fazia com mérito, valorizando a raça brasileira. A miscigenação do branco, índio e negro era vista na seleção como o fator extra que o Brasil tinha e que as outras seleções não. "Creio que uma das condições para a vitória dos brasileiros nos encontros europeus, prende-se ao fato de termos a coragem de mandar à Europa desta vez um team francamente afro-brasileiro" (FREYRE apud NEGREIROS, p. 223). Tudo isso dentro da política dos valores das verdadeiras raízes brasileiras pretendida por Vargas.
O dia 5 de junho de 1938 entrou para a história do rádio no Brasil. Com a narração de Gagliano Neto e o patrocínio do Cassino Urca, o brasileiro pode acompanhar pela primeira vez uma Copa do Mundo ao vivo, pelo rádio. A seleção se saiu bem na estreia frente à Polônia vencendo por 6 a 5 e encantando os franceses com um jogo decidido na prorrogação com três gols de Leônidas. Os jornais cariocas divulgaram o primeiro jogo do Brasil na Copa desta forma:
"Todo o Brasil, esportivo ou não, estará com sua atenção concentrada, amanhã, na estréia dos brasileiros na III 'Taça do Mundo'. Jamais a alma do povo brasileiro vibrou tanto em torno da campanha de uma representação nacional numa competição esportiva no estrangeiro, e a ansiedade é plenamente justificável, pois pela primeira vez nos empenhamos seriamente em rumar para o outro lado do Atlântico perfeitamente organizados e contando com o apoio moral e material de toda a nação. (...)(NEGREIROS, 1998)

A novidade de uma transmissão ao vivo direto do continente europeu, maravilhava os brasileiros, que paravam para acompanhar a seleção. Os que não tinham rádio ficavam no Largo do Paissandu, em São Paulo, ou diante da Galeria Cruzeiro, no Rio de Janeiro. Por todo o país, os estádios de futebol e as praças também tinham alto-falantes que faziam toda uma nação torcer para 11 brasileiros na França. O narrador Gagliano Neto, que fez toda a transmissão da Copa para o Brasil, viajava junto com a seleção, tornando-se além de um narrador, um “integrante” do time, o que ficava claro nas transmissões e ajudava a criar o sentido de coletividade em torno da seleção nacional. Na cobertura do rádio na Copa do Mundo de 1938, as Organizações Byington, poderoso grupo econômico, detinha exclusividade da transmissão e cabine de rádio cativa nos principais estádios brasileiros na época.

Os cinco prélios dos quais o scratch brasileiro participou, mais o match final que decidiu o certamen, foram irradiados para a Cadeia de Emissoras Buyngton. Formada pelas rádios Clube do Brasil e Cruzeiro do Sul do Rio de Janeiro, Cosmos e Cruzeiro do Sul de São Paulo, além da Rádio Clube de Santos, em colaboração com os jornais O Globo e Jornal dos Sports, sob o patrocínio exclusivo do Cassino da Urca, o sucesso foi imediato. Conforme o team patrício, constituído por moços fortes, fazia cair os adversários, outras emissoras, de norte a sul, de leste a oeste do país foram se integrando à performance espetacular do rádio.( ORTRIWANO, 2000)

Uma vez que apenas um Grupo transmitia, o público ficava com apenas um discurso, apenas um olhar sobre o evento, podendo ser manipulado de acordo com a vontade de quem queria tirar proveito do torneio: o governo.
Depois da Polônia, veio a Tchecoslováquia e após um jogo e uma prorrogação empatada, Roberto fez o gol que levava o Brasil à semi-final no jogo de desempate. O país inteiro acreditava no título, pela primeira vez o Brasil ia longe em uma Copa. A próxima adversária seria a Itália, atual campeã e favoritíssima, até porque a seleção não teria Leônidas. Mas o país inteiro acompanhava pelo rádio os jogos, como se pudesse em pensamento entrar em campo e defender as cores do Brasil. Os jogadores eram o país inteiro numa coletividade construída pelo governo Vargas.
A derrota com um pênalti duvidoso cometido por Domingos da Guia e convertido por Giuseppe Meazza, levou o Brasil à disputa de terceiro lugar contra a Suécia. E fez Getúlio escrever em seu diário: “O jogo de ‘football’ monopolizou as atenções. A perda do ‘team’ brasileiro para o italiano causou uma grande decepção e tristeza no espírito público, como se se tratasse de uma desgraça nacional”(VARGAS, 1995, v.2, p.140).
Leônidas marcou mais 2 gols contra a Suécia, terminou a Copa como artilheiro e ganhou o apelido de “homem-borracha”, por fazer lances incríveis, alguns deles que permanecem até hoje no futebol, como a bicicleta. Foi usado como garoto-propaganda para “emprestar” seu recente apelido “diamante-negro” a um chocolate até hoje comercializado no Brasil. Os jogadores foram ovacionados em sua chegada ao Brasil, desfilaram em carreatas e os jornais exaltaram a força do time, que só teria perdido pelo erro de arbitragem. O futebol passou a ser algo de grande importância para o brasileiro. Tornou-se popular, fez o brasileiro se ver como indivíduo de uma nação através de um grande elemento identificador: o futebol.
O ano de 1938 é assim o marco histórico, se precisamos de um, da descoberta do Brasil como o “país do futebol”, unido de modo nacional à noção de brasilidade emanada de sua seleção em campos estrangeiros, jogando com características próprias e que, com o tempo, se tornariam indissociáveis da própria definição que o brasileiro faria de si mesmo. (GUTERMAN, 2009, p.84)

Esse tipo de tratamento dado ao futebol não foi por acaso. Vargas, que afirmava que “quando perde a seleção, perde o país”, percebeu o potencial de mobilização que esse esporte tem e o usou para implementar a política nacionalista de seu governo, criando um patriotismo em torno do esporte bretão que dura até hoje na sociedade brasileira.



Copa de 1970 – “Pra frente Brasil!”
Após a Copa de 1938 o futebol se tornou sinônimo de brasilidade, em 1950 a derrota foi uma comoção nacional poucas vezes vista na história do país, os títulos vieram em 1958 e em 1962. Em 1966 todos esperavam o tricampeonato do Brasil, mas após uma série de erros na preparação da seleção que chegou a convocar 44 jogadores para chegar aos 22 que iriam para a Inglaterra, o time foi eliminado na primeira fase. A idéia de desorganização e indisciplina eram os pontos mais falados e tidos como explicação para a derrota. O Brasil vivia um regime militar desde 1964, mas em 13 de dezembro de 1968, o país conheceria o mais duro golpe à sua democracia: o AI-5. A escuridão em que o Brasil mergulhava com o ato duraria um longo tempo. O regime militar precisava de uma legitimação, mostrar o que para os militares era óbvio: era um governo que tinha salvo o país. O povo tinha que aceitar a idéia de que o milagre econômico, ao lado do autoritarismo e um nacionalismo forte seriam o caminho para o país atingir o desenvolvimento.
Foi dentro desse cenário que Emilio Garrastazu Médici assumiu o país em 30 de outubro de 1969. Médici era um representante da linha dura militar e queria de qualquer forma obter a legitimidade popular. Ex-atacante do Grêmio de Bagé, o general era bem visto pelos trabalhadores, pois o país vivia uma época fértil para o emprego, e tinha uma identificação muito grande com o futebol. Somando a esses dois fatores à proximidade da Copa de 1970, encontramos o grande objetivo de Médici: tornar a Copa um momento mágico da história brasileira. Esse fator gerou um paradoxo na sociedade brasileira. De um lado a intelectualidade brasileira, que estava na luta armada ou no exílio considerava que torcer para a seleção seria compactuar com o regime e de outro lado, como não torcer para uma seleção repleta de craques e que jogava o futebol genuinamente brasileiro? (GUTERMAN, 2009)
Antes da Copa o técnico era João Saldanha, comentarista esportivo de grande popularidade e prestígio que tinha dirigido o Botafogo em 1957, conquistando o Campeonato Carioca. Saldanha tinha ligações com o PCB e tinha sido militante comunista nos anos 40. Sua campanha com a seleção foi excelente: 6 jogos, 6 vitórias. Mas um clima de instabilidade começou a ser enfatizado pela imprensa, como noticiou o jornal Última Hora. “Os jogadores quase não falaram, demonstrando para muita gente que há algo de errado.” (ÚLTIMA HORA apud GUTERMAN, 2009. p.164)
As críticas à seleção geravam respostas contundentes de Saldanha, criando um clima insuportável, culminando na declaração do então técnico do Flamengo, Yustrich, que era um dos cotados para assumir a vaga do “João sem medo”. “Se Saldanha continuar com o mesmo comportamento que teve até agora, acho que pode haver uma intervenção do Exército na seleção, como já aconteceu em outros países onde, como no Brasil, o futebol tem, grande repercussão na vida nacional.”(ÙLTIMA HORA apud GUTERMAN, 2009, pg. 165) Como Saldanha não abriria mão de seus princípios e não se submeteria a nenhum tipo de imposição que não a sua, foi demitido por João Havelange, então presidente da CBD. Após essa polêmica, Saldanha disse sua célebre frase: “Eu não escalo seu ministério e você não escala minha seleção”. Jairzinho, furacão da Copa de 1970, afirma que “O que aconteceu foi que a retirada de Saldanha foi uma decisão política. Nem política, porque era ditadura, e política não existia. Foi uma imposição do presidente Médici. Foi um procedimento protocolar da ditadura.”(O POVO apud GUTERMAN,2009, p. 169).
Essa discussão polêmica das interferências de Médici na seleção ganhou um outro episódio com a chegada do substituto de Saldanha, Zagallo. A convocação de Dario para Copa gerou uma grande discussão: se Médici tinha pedido a Zagallo, ou o próprio técnico tinha escolhido levar Dadá Maravilha. Esses episódios dentro da seleção levaram o ministro da educação Jarbas Passarinho a pedir explicações sobre a crise na seleção, a se reunir com Médici e declarar: “a discórdia nesse campo (a seleção brasileira) abala profundamente a opinião pública do país.”(ÙLTIMA HORA apud GUTERMAN, 2009, p.171) E dessa forma formou-se um consenso entre os militares de que a seleção precisava de ordem e disciplina. Havelange passou a receber ordens do governo, que as repassava para Zagallo. A escalação da seleção era criticada pelo ministro Passarinho e uma pressão enorme passou a ser colocada no time. A ditadura queria a Copa para afirmar seu projeto de grandeza para o país.
O ufanismo era representado pela marchinha composta por Miguel Gustavo que venceu um concurso promovido pelos patrocinadores da Copa. A letra demonstrava exatamente o projeto de Governo de Médici para o país: “Noventa milhões em ação, pra frente Brasil, salve a seleção! De repente é aquela corrente pra frente, parece que todo Brasil deu as mãos. Todos ligados na mesma emoção, tudo é um só coração! Todos juntos vamos! Pra frente Brasil! Salve a seleção!” Todo um país unido por um mesmo ideal, pra frente, continuar com o que estava sendo feito. Todos ligados na mesma emoção, de mãos dadas, juntos, era tudo que a ditadura queria, o povo legitimando o governo por intermédio do futebol.
A disciplina, que segundo os militares, foi a responsável por colocar o país nos trilhos, também foi considerada um pilar do tricampeonato. A seleção tinha em sua delegação um major-brigadeiro como chefe, Jerônimo Bastos, além de um major, Roberto Câmara Lima Ipiranga dos Guaranys, um capitão, Cláudio Coutinho e um tenente, Raul Carlesso. A idéia de que o coletivo prevalecia sobre o individual e que só se conseguiria o sucesso com harmonia e ordem, eram usados pela ditadura na seleção.
Se Getúlio experimentou pela primeira vez uma Copa do Mundo ao vivo via rádio e isso foi fundamental para a integração nacional desejada por ele, o que dizer da Copa de 1970? Pela primeira vez uma Copa do mundo era transmitida ao vivo e a cores pela televisão, 16 estados e o distrito federal assistiram à Copa do Mundo.
...levando em conta que o fato de que a transmissão ao vivo era uma novidade tecnológica excitante, é praticamente impossível dimensionar exatamente a explosão de sentimentos que a Copa do Mundo de 1970 proporcionou aos brasileiros. A propaganda oficial do governo explorou isso. Numa peça da Agência Especial de Relações Públicas (AERP) veiculada pela TV em março de 1970, que mostrava um gol de Tostão pela seleção brasileira, dizia-se que o futebol e a vida se equivaliam: “O sucesso de todos depende da participação de cada um. (GUTERMAN, 2009, p. 182)

Já nos anos 60 as telenovelas eram sucesso de audiência e mostravam que os brasileiros estavam seduzidos pelas imagens geradas pela televisão. Esse veículo ajudou a disseminar o discurso de unidade nacional pretendida pelos militares, contribuindo decisivamente para sua afirmação no poder e ampliando sua popularidade.
Mas foi na década de 70 que a televisão ganhou o país. Os militares perceberam ainda mais a força desse novo veículo de comunicação e incentivaram a compra dos aparelhos, o que os levou a uma penetração de 24,1% da população. Os televisores antigos preto e branco eram trocados pelos coloridos que recebiam durante a Copa do Mundo do México, em caráter experimental, os primeiros sinais de televisão colorida via satélite no país. Era um luxo que poucos puderam utilizar, mas já demonstrava o quanto a televisão seria importante na cultura nacional e na divulgação e proliferação de discursos.
A cobertura feita pelas emissoras de TV, rádio e jornais nessa Copa retratava o que acontecia na imprensa do país. Críticas sobre a seleção eram entendidas como críticas ao regime. Mas, ao contrário do monopólio das organizações Byington em 1938, o regime criou um “pool” de emissoras para transmitir a Copa de 1970, chamado Rede Brasileira de Televisão. Dentre as emissoras que participaram desse “pool” estavam a Rede Globo de Televisão e a Rede Bandeirantes. O pool também visava passar a idéia de unidade nacional, todas as emissoras juntas pelo objetivo único: o Brasil. E também ajudou no discurso para validar o governo, uma vez que cedendo o direito a várias emissoras passava-se a idéia de democratização nas informações.
A estreia do Brasil não poderia ter sido melhor: 4 a 1 na Tchecoslováquia com uma exibição de gala. A imprensa exaltava as qualidades do time, que jogava o futebol verdadeiramente brasileiro e este texto da seção Sumário da Folha de São Paulo demonstra o valor político daquela seleção:
Saibam todos que Pelé, Jair e Rivelino, com os tentos que marcaram, conseguiram esvaziar boa parte dos descontentamentos a que aludíamos e deram ao presidente Médici uma colaboração valiosíssima.(...)Realmente, tudo leva a crer que, se a seleção brasileira levantar a Copa do mundo, o acontecimento terá repercussões profundas para o país, dentro e fora dele. Na esfera interna , nem se fala. (...) As metas de uma administração dependem das metas nos campos esportivos. No caso brasileiro, essa interdependência é ainda mais profunda, de vez que nosso esporte, o futebol, está entranhado nas obras mais íntimas da alma popular(...) Por isso mesmo o governo do presidente Médici andou bem em emprestar apoio ao nosso selecionado que peleja nos gramados estrangeiros. (FOLHA de SÃO PAULO apud.GUTERMAN, 2009, p. 174)

O segundo jogo foi contra os ingleses, as duas últimas seleções campeãs do mundo, num grande jogo o Brasil venceu por 1 a 0. Médici mandou um telegrama para a delegação brasileira parabenizando pela vitória. O terceiro jogo contra a Romênia, vitória de 3 a 2 para o Brasil e a classificação para as quartas de final. O adversário na segunda fase seria o Peru, vitória do Brasil por 4 a 2 e dessa vez Médici ligou para a comissão técnica e mandou dizer aos jogadores que confiava na “nossa vitória final”.
Na semifinal o adversário seria o Uruguai. Impossível falar de Brasil e Uruguai em Copa do Mundo e não se lembrar de 1950. No dia do jogo, 40 guerrilheiros que o governo trocara pelo embaixador alemão Ehenfried Anton Theodor Ludwig Von Holleben, iam para o exílio na Argélia. O governo tratou de usar a Copa para tratar os “subversivos” como desagregadores do Brasil. Afirmou-se até que o sequestro estava desestabilizando os jogadores no México e que atos como esse eram um mal para a nação que, unida e que com “todos juntos”, estavam levando o país para o desenvolvimento, “prá frente”. A nota da Folha de São Paulo revela a força do regime em ditar as matérias conforme seu interesse:
Causou profundo impacto na seleção a noticia chegada ao México sobre o sequestro do embaixador alemão. Pelé, Brito, Rivelino, Clodoaldo e outros craques lamentaram que maus traidores e criminosos venham quebrar a tranqüilidade e entusiasmo da seleção. Lamentaram nossos craques que os terroristas, a serviço de países comunistas, tentem com atos criminosos atingir um país amigo.(ESTADO DE SÃO PAULO apud. GUTERMAN, 2009, p. 177)

O Brasil venceu o Uruguai por 3 a 1 e estava na final da Copa. Toda a pressão, toda a mobilização nacional criada estava a um jogo do grande objetivo. Ninguém no governo aceitaria outro resultado que não fosse a conquista definitiva da Jules Rimet. A vitória por 4 a 1 sobre a Itália eternizou uma seleção cheia de craques.
A ditadura militar recebeu os jogadores em Brasília, usou da conquista para defender suas idéias e o clima de alegria ajudou a esconder o que acontecia nos porões do regime, em sua época mais dura e cruel. Depois da Copa nos tornamos o país do futebol, mundialmente conhecido. A ditadura usou o futebol como propaganda e a vitória da seleção ajudou a passar uma idéia de que estava-se no caminho certo da nação, o milagre brasileiro estava concretizado. Além disso, ajudou a fazer de Médici um homem popular, que gostava de futebol e torcia pela seleção como qualquer outro brasileiro, desta vez ao invés do rádio, pela televisão.
Na Copa de 1974, também explorada pelos militares, houve um verdadeiro “boom” das televisões coloridas no país, consolidando sua importância na sociedade brasileira. Só para se ter uma idéia do impacto da Copa na venda de televisores e no impacto dentro da sociedade brasileira, a chegado do homem a lua teve menos audiência do que o jogo Brasil e Inglaterra em 1970. É claro que na época do jogo tínhamos mais televisores do que um ano antes. (EGYPTO,1970)
Toda a unidade e identificação nacional através do futebol, iniciado por Vargas em 1938 se concretizou e se enraizou de forma soberana na cultura nacional após a Copa de 1970. O regime militar entendeu que esse processo estava concretizado e após criar a loteria esportiva em 1969, ainda no governo Costa e Silva, criou o Campeonato Brasileiro. Antes disputado com o nome de Roberto Gomes Pedroza, Taça Brasil e Torneio Rio São Paulo, o Brasileirão foi adaptado aos projetos do governo para unir o país através do futebol, demonstrando sua grandeza.. Assim, o campeonato teve um inchaço de times e a evolução do número de participantes era o reflexo do desgaste da ditadura que ganhou um bordão. “Onde a Arena vai mal um time no nacional”. Em 1979 o campeonato teve 94 times. Além disso, construiu estádios com capacidades gigantescas em todo país, como o Colosso do Arruda em Recife, tudo para integrar multidões através do futebol.

Considerações finais
Mesmo em tempos de democracia, todos os presidentes que tiveram a seleção brasileira campeã do mundo durante seu mandato, usaram do título para propaganda do governo. Desfile em carro de bombeiro nas principais cidades do país, entrega de medalhas no Palácio do Planalto, palpites em escalação do time, aprovar ou não uma convocação de um jogador, tudo isso foi feito pelos presidentes. É uma ação que os torna populares, como qualquer brasileiro, cada um tem seu time, suas críticas, seu amor por um clube. Destaca-se também o fato do ano de eleições nacionais e estaduais coincidirem com ano de Copa do Mundo. A onda de patriotismo e nacionalismo começa em junho, antes das eleições em outubro, associando política e futebol, demonstrando sua importância no país. Usado pela política como afirmação de um governo ou como ponte para uma onda de positivismo após conquistas, o futebol tem um papel único na sociedade brasileira.
Seja em 1938 com o rádio, ou em 1970 com a televisão, os meios de comunicação de massa ajudaram na difusão das idéias pretendidas pelos governantes de cada época, e contribuíram para unir o país em torno de um aparelho para torcer por 11 homens que levavam o nome do Brasil em uma camisa de futebol e, cada um na sua proporção, ajudou os dirigentes da nação a alcançarem seus objetivos.


REFERÊNCIAS

BOSCHILIA, Bruno; MARCHI, Wanderley Jr. Identidade nacional e a Copa do Mundo de 1938 Buenos Aires: Revista Digital - Ano 11 - N° 102, 2006

EGYPTO, Luiz. “Futebol atraiu mais gente à TV que a chegada à lua”.In: O Globo, 09/06/1970;

FRANZINI, Fábio. Corações na ponta da chuteira: capítulos iniciais da história do futebol brasileiro (1919-1938).Rio de Janeiro: DP&A, 2003.

GUEDES, Simoni L. O Brasil no campo de futebol. Estudos antropológicos sobre os significados do futebol brasileiro. Niterói: EDUFF, 1998.

GUERRA, Márcio de Oliveira. Rádio x TV: O jogo da narração. A imaginação entra em campo e seduz o torcedor. Rio de Janeiro, 2006. Tese(Doutorado em Comunicação) – Escola de Comunicação, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2006

GUTERMAN, Marcos. O futebol explica o Brasil: uma história da maior expressão popular do país. São Paulo: Contexto, 2009.

NASCIMENTO, Paulo Henrique do. A copa do mundo de 1938: nacionalismo e a identidade nacional brasileira em campo. Histórica – Revista Eletrônica do Arquivo Público do Estado de São Paulo, n.30, 2008.

NEGREIROS, Plínio José Labriola de C. O futebol e identidade nacional: o caso da copa de 1938. Departamento de História Universidade Federal do Paraná (Brasil),1998. Disponível em www.efdeportes.com/efd10/copa381.htm. Acesso em: 20mar.2010

ORTRIWANO, Gisela Swetlana. França 1938, III Copa do mundo O rádio brasileiro estava lá. Universidade de São Paulo ECA, 2000.

RIBEIRO, Luiz Carlos. Brasil: futebol e identidade nacional. Departamento de História. Universidade Federal do Paraná. Disponível em: HTTP://www.efdeportes.com/efd56/futebol.htm. Acesso em: 20mar.2010

SOARES, Edileuza. A bola no ar: o rádio esportivo em São Paulo. São Paulo: Summus editorial LTDA, 1994.

VARGAS, Getúlio. Diário / apresentação de Celina Vargas do Amaral Peixoto; edição de Leda Soares. São Paulo: Siciliano; Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1995, v. 2.

domingo, 19 de setembro de 2010

Comício Lula em Juiz de Fora

http://www.youtube.com/watch?v=FqHAB_hYEu4
http://www.youtube.com/watch?v=zBLIxzi6voE
http://www.youtube.com/watch?v=WworCY40VhM
http://www.youtube.com/watch?v=Fo-bvLOATU8
http://www.youtube.com/watch?v=qfAZWi6ySUc

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Um golpe na democracia

Basta uma simples volta no centro ou qualquer outra região mais movimentada de Juiz de Fora ou outra cidade do mesmo porte para assistirmos no que se transformou a eleição. Seja para prefeitura, câmara, senado a degradação humana só aumenta. Já é constrangedor para qualquer cidadão que tem o mínimo de senso crítico ver pessoas fantasiadas com banner de candidatos, balançando bandeiras, distribuindo panfletos, colando adesivos e outras coisas conhecidas como militância. É claro que alguns candidatos têm realmente pessoas que acreditam em suas propostas e fazem campanha para elas. Nada contra essa prática, mas o que assistimos é um circo com pessoas que sem emprego, se submetem a qualquer tipo de serviço. Um serviço degradante sim, que suja a cidade, coloca placas e mini banner em qualquer lugar que possa persuadir o eleitor mesmo que seja de forma ilegal. A minha indignação com esse “serviço” é grande e só poderemos acabar com isso com emprego digno para todos, para que as pessoas não se submetam a essas situações para ganhar votos para quem com certeza não se preocupará com elas e nem com os outros quando for eleito. Mas outra situação absurda é: se temos tanta gente trabalhando, tanta bandeira, tanto carro de som, tanto banner, tanto adesivo, tanto santinho, tanto tanque de gasolina para motoqueiros que levam seu nome, é necessário dinheiro para tudo isso. Aí entra a maior vergonha das eleições e que só vem aumentando e de vez em quando se escuta dizer que alguém perdeu o cargo por isso: abuso de poder econômico. Hoje em dia só ganha eleição quem tem dinheiro, e muito. E de onde será que vem tanta fortuna para ser gasta em apenas dois meses? Para um simples entendedor de matemática é fácil perceber que os eleitos terão um gasto muito maior na campanha do que vão receber pelos 4 anos de serviço ao povo brasileiro. Fazem isso então por amor à pátria? Por querer realmente mudar o país e estão dispostos a gastar milhões para isso? Alguns alegam doadores. Meus amigos, quem vai doar grandes quantias de dinheiro para uma campanha se o candidato não exercer seu mandato visando os seus interesses? Isso pensando por baixo, porque na maioria das vezes os grandes investidores de campanha ganham por “sorte” licitações, contratos e convênios milionários. Se o doador quer ajudar alguém porque não doa dinheiro aos necessitados? Sem contar o dinheiro desviado de verbas públicas que vão parar em campanhas de pessoas que já estão no governo e a compra descarada de votos em alguns municípios. A nossa democracia está totalmente fragilizado com esse quadro. Quem não tem dinheiro não pode se eleger. Isso só pode ser mudado com uma rigorosa fiscalização das contas de campanha, feita com dinheiro público, destinando o mesmo valor para cada candidato, colocando todos em igualdade de condições financeiras. Infelizmente, isso no nosso país é o mesmo que deixar a raposa tomar conta das galinhas.

terça-feira, 11 de maio de 2010

Time de Dunga e meus Convocados

Time de Dunga e Meus convocados

Goleiros:
Júlio César – melhor goleiro brasileiro atualmente e entre os 3 melhores do mundo, salvou Dunga várias vezes e vai salvar na Copa. Será o melhor jogador brasileiro no Mundial. Indiscutível.

Doni – não existe nenhuma explicação lógica, coerente e plausível para sua convocação. A história de que brigou com o Roma para estar na seleção e por isso foi para reserva é pura enrrolação e me surpreende como todos os jornalistas estavam apáticos as respostas ensaiadas de Dunga, os da Globo nós entendemos mas e os outros? É um goleiro que está sem ritmo de jogo, isso já fala por si só.

Marcos – experiente, bom de grupo e um goleiro fantástico, um dos melhores que já vi, seria um excelente reserva para o Júlio


Gomes – nunca achei bom goleiro muito menos para servir a seleção. Não transmite segurança.

Vítor – bom goleiro e jovem, levaria para pegar experiência para 2014.

Laterais

Maicon – não me agrada sua correria e falta de inteligência, mas está numa fase excepcional e futebol é momento, seu entrosamento com Lúcio pesa muito

Daniel Alves – grande jogador, tem mais bola que Maicon com a bola no pé, mas sem ela é um marcador desleal e afobado, podendo ser expulso em qualquer dividida. Levaria pela experiência internacional e seu talento com a bola nos pés.

Gilberto – foi muito bem em 2006, mas de lá para cá não atua como lateral. É muito arriscado tentar readaptá-lo a função em 30 dias. Mas respeito por ser um bom jogador.

Roberto Carlos – muito criticado em 2006, mas não apareceu nenhum jogador que jogasse metade do que ele jogava na seleção, até porque todos os laterais esquerdos brasileiros no exterior não atuam na lateral, é arriscado levar quem não está adaptado a posição que é necessário marcar. Está bem no Corinthians e tem experiência de sobra para ajudar o time.

Michel Bastos - com todo respeito ao jogador mas nunca terá bola para vestir a camisa da seleção, invenção de Dunga. Ainda por cima está jogando de ponta em seu time. Deu sorte de ser o último a ser testado e o menos pior na posição dentre todos que foram testados.

Marcelo – despontou bem no Flu. Sabe jogar bola, tem habilidade e está jogando de lateral no Real. Seria bom reserva do Roberto, pegaria experiência para 2014. Iria mais pela falta de concorrentes.

Zagueiros

Lúcio – deixou de lado os momentos de maníaco do parque e foi o destaque do Brasil em 2006, está jogando muito, entre os melhores zagueiros do mundo. Titular absoluto.

Juan – craque e também destaque em 2006. Não vem bem no Roma mas é um zagueiro excepcional e com experiência em Mundial, categoria como poucos. Sua parceira com Lúcio é um dos pontos fortes do time.

Thiago Silva – será um dos maiores zagueiros da história do futebol brasileiro. Cracasso. Dependendo da forma de Juan até o colocaria como titular. Indispensável pela sua categoria e futuro capitão em 2014.

Luisão - não sou muito fã de seu futebol, mas entre os zagueiros do São Paulo que tem um lobby fabuloso, ficaria com sua experiência internacional, mas só jogaria em caso de contusão ou desespero total.

Meias

Gilberto Silva – é um bom primeiro volante, apesar de ter no Brasil jogadores melhores que ele nessa função o levaria pela sua experiência para o time e para o grupo.

Josué – fabricado pela mídia paulista junto com Mineiro, é digno de pena. Não joga nada, só está na seleção porque Dunga não gosta de futebol bonito. Nunca convocaria.

Lucas – titular do Liverpool, grande jogador, sabe marcar e sair jogando, o testaria como primeiro volante par colocar Gilberto Silva no banco. Grande talento e presença certa em 2014.

Felipe Melo – símbolo do futebol Dunga, muita marcação, trombação e pouco futebol. Está numa fase péssima, só foi convocado por fazer parte da panela Dunga. Não tem futebol para jogar na seleção.

Hernanes – jogando como segundo volante é um grande jogador, tem mais bola que Felipe Mello e Josué disparado, levaria pelo seu talento com a bola e eficiência na marcação.

Júlio Batista – muito fraco, muito brucutu, muita força e vigor físico e pouco futebol, não levaria. Só está na seleção porque toca cavaquinho no Samba do Robinho

Ronaldinho Gaúcho – craque indiscutível. Mesmo no banco seria importante para o grupo, entrando em campo muda qualquer jogo. Não é o mesmo com arrancadas e dribles, mas sua visão de jogo e passe estão entre os melhores do mundo, o tempo se encarregará de confirmar que será um crime deixá-lo de fora da Copa.

Kaká – muito mal e com problema crônico. Convocaria por ser um craque e pode render mais entrando no meio de um jogo. Não pode ser titular pois não vai aguentar jogar no seu nível normal 90 minutos. Tem que estar no grupo pelo seu talento e respeito internacional.

Kleberson – não fez grandes atuações para merecer a seleção, no Flamengo sempre foi ofuscado por Ibson que tem muito mais bola que ele. Nem com a saída Dele, Kleberson conseguiu se firmar como dono do meio campo do Flamengo.

Ganso – vai ser o grande jogador do mundo na próxima Copa. Tem que ir, seu talento é fantástico, um gênio. O mundo ainda não conhece suas jogadas pode entrar e desequilibrar um jogo. Se fosse técnico apostaria no garoto como titular.

Elano – bom jogador, levaria

Ramirez – volante que sabe jogar com a bola nos pés é raro, levaria ele.

Atacantes
Luís Fabiano – pelo que fez nesses 4 anos não pode ficar de fora. Na Seleção não decepcionou, é matador nato, nasceu para fazer gol, apenas isso.

Nilmar – grande jogador mas não levaria não o vejo com peso para decidir um jogo de Copa, é jogador de clube. Não se compara a Ronaldo, mesmo o fenômeno estando mal fisicamente.

Ronaldo – já teria entrado em contato com ele e fazer como Felipão fez em 2002, faria um planejamento para ele chegar voando na Copa. Em forma, mesmo velho e um pouco acima do peso não existe atacante melhor que ele no mundo. Mesmo que no banco assusta qualquer zagueiro, é um pecado deixá-lo de fora da sua última Copa.

Robinho – muita habilidade, grande futebol, vem muito bem na seleção, chamaria sua atenção para não transformar tudo em baderna como tem o hábito de fazer

Grafite- não o levaria, mostrou que poderia ir para a Copa muito mais em 2006 do que agora, na época foi atrapalhado por uma contusão. Só ganhou a vaga porque Adriano fez de tudo para não ir á Copa.

Neimar – jovem craque, muito mais promissor do que Robinho. Na sua idade Robinho não sabia finalizar, seu único problema é se tornar um presepeiro como Robinho. Muda um jogo com sua habilidade e talento. Tem personalidade e faria uma excelente Copa quando entrasse em campo.

sexta-feira, 23 de abril de 2010

"A decisão – até o momento irreversível – da presidente Patrícia Amorim de trocar todo o comando do departamento de futebol causou profundo desconforto nos jogadores.

Adriano, por exemplo, ligou para o vice de futebol Marcos Braz no fim da noite de quinta-feira e colocou-se à disposição para “fazer o que for” a fim de impedir a demissão do dirigente. Outros atletas tiveram a mesma atitude e também criticaram a mudança repentina em toda a estrutura do departamento às vésperas de uma partida decisiva."


A notícia acima saiu no Globo.com e reforça o meu post abaixo. Claro que os jogadores ficaram com raiva da saída de não só do Andrade mas de todo departamento de futebol. Agora podem perder as regalias e privilégios e quem quer que chegue ou Muricy ou Joel vai colocar a cambada para treinar e trabalhar muito. Acho que o grupo aceitaria melhor Joel do que Muricy, até porque o "papai Joel" sabe conciliar mais o desejo dos jogadores mas desta vez se deixar tudo como está não vai conseguir sucesso, tem que trabalhar forte como fez no Bota e levou um time desacreditado e de plantel fraco ao título do Carioca. Que a decisão seja tomada rápida pela diretoria pois quem assumir já terá um duro começo pela frente na próxima quarta contra o Corinthians e os jogadores entendam que estão tendo uma segunda chance de ouro para se redimir com a torcida. Terão que se dedicar ao máximo nesses próximos 5 dias pois o Corinthians está bem a frente do Fla, somente um time com raça e usando a camisa como segunda pele poderá vencer e arrancar para um possível título com muito mais moral e confiança do torcedor. 5 dias resumirão não só o semestre mas o ano do Fla.

quinta-feira, 22 de abril de 2010

Andrade e o Flamengo

Andrade sempre foi o tapa-buraco das diretorias do Flamengo. No Brasileirão do ano passado como não tinha ninguém de peso no mercado quando Cuca saiu, deixaram o tromba segurar o rojão. O time estava mal, com jovens da base sendo desesperadamente colocados no time titular, falava-se até em rebaixamento. Aí, pela primeira vez em uns 10 anos vi todos os contratados no meio de uma temporada se encaixarem de forma perfeita em uma equipe: Álvaro consertou a zaga, que andava perdida desde a aposentadoria de Fábio Luciano, Maldonado arrumou a marcação no meio e Pet foi o craque que faltava para deixar Adriano na cara do gol. O resultado foi o Flamengo campeão e o trabalho de Andrade nesse período não deve ser esquecido.
Porém, nesse tempo o time vencia os jogos, e a vitória mascara muito os defeitos. Uma diretoria em pé de guerra com a chegada das eleições no clube e até a vinda de Pet foi conturbada por ter chegado como acerto de dívida. Adriano com regalias, bolhas no pé, Pet no auge também não treinava com os outros e volta e meia era liberado pela diretoria. Tudo isso deu certo e não foi problema porque dentro de campo o time vencia. Mas as boas atuações não vieram nas 3 últimas rodadas, Goiás, Corinthias e Grêmio o Fla jogou mal e como os outros times não aproveitaram suas chances o Flamengo foi campeão. Um novo ano começava e a esperança do torcedor era enorme com o título da Libertadores, além do mais com a chegada de Vágner Love. As confusões nos bastidores continuavam mas as vitórias vinham, era inevitável que quando a derrota viesse tudo de podre que exista na Gávea viria à tona. Os jogadores ao invés de se dedicarem nos treinos e perceberem que tinham condições para ganhar uma Libertadores e Carioca relaxaram. Talvez por acharem que eram bons demais e treinar estava atrapalhando seus pagodes, funks, e chatubas da vida. E no futebol de hoje, somente a técnica não funciona mais, mesmo porque nenhum deles é tão técnico assim que se possa dispensar o treino. Somente dois gênios da história do futebol brasileiro não treinavam a semana inteira e jogavam de forma espetacular no final de semana: Garrincha e Romário. O Botafogo tem um time inferior tecnicamente que o Flamengo mas jogou com uma aplicação e vibração que engoliu os flamenguistas na decisão. Sem treinar e sem vibração não se consegue nada, milagres não acontecem. A pergunta que você deve estar se fazendo agora é: onde Andrade entra nessa história? Andrade não teve pulso para fazerem os jogadores sair desse marasmo, aceitava reuniões com os líderes do elenco que pediam folgas, adiamento de treinos, rachões ao invés de treinos para corrigir a defesa, finalização para o ataque, jogadas ensaiadas. Foi passivo frente a tudo isso, e foi mantido pela diretoria pela sua passividade que não trazia atritos com o grupo que mandava muito mais que ele no time. Talvez por conhecer demais o clube, não cobrou o que deveria cobrar, mas pecou demais em insistir em escalações erradas e sucumbiu a pressão de seus comandados quando ele deveria comandar. Ele fez muito pelo Flamengo e deve e será lembrado para sempre por isso, mas como técnico não tem mais clima nem poder com os atletas para isso. Ele saindo tudo vai mudar? Não. A bagunça é muito maior do que nós imaginamos, o grande time montado vai se dissolver, alguns jogadores vão continuar, a guerra política no clube é eterna, e o próximo técnico terá muito trabalho. Não gosto de Muricy mas ele seria a melhor pessoa para tentar colocar ordem na casa. A primeira coisa que deve acontecer no clube é mudança de atitude, não em campo, mas na vida dos jogadores e diretoria, perceberem o que essa instituição chamada Flamengo representa para uma nação de pessoas, no mínimo darem a vida dentro de campo e fora dele também. As regalias existe sim para jogadores, mas no final do mês quando o salário chega, aí é que o Adriano se difere do reserva ou do jogador mediano, no salário. Não treinar e não se dedicar a sua profissão é sinônimo de fracasso porque sem dedicação e paixão ninguém chega a lugar nenhum.

domingo, 11 de abril de 2010

Brasil e o time de Dunga

Quando terminou a Copa do Mundo de 2006 o brasileiro estava indignado com a falta de comando e empenho em uma seleção brasileira. Nunca se viu um grupo tão talentoso e tão sem compromisso com a competição que significa muito para o povo brasileiro. Querendo suprir essa falta de pulso firme no time canarinho, a CBF anunciou Dunga para o cargo de técnico. Sem nunca ter exercido essa função, levou o companheiro do tetra, Jorginho, para ser seu auxiliar, já que ele tinha uma “experiência” como treinador no América do Rio. O recado estava claro: se o povo quer alguém de pulso, damos o capitão do tetra para comandar o time. O único jogador que xingou ao receber a taça FIFA, símbolo e sinônimo do futebol feio e burocrático que nada tem a ver com as tradições e raízes brasileiras no futebol.
A verdade é que Dunga seria um tapa buraco até Felipão terminar seu contrato no Chelsea. Ninguém confiava que daria certo, nem ele mesmo. Mas aí esbarramos num fator que a imprensa tanto critica e apoiou em Dunga: no futebol não podemos analisar apenas o resultado e sim o trabalho que é feito. Ou seja, ás vezes um time joga bonito, tem um padrão de jogo, bons jogadores, mas não vence. Ou no caso de Dunga, joga feio, mas tem resultados. O primeiro grande feito do homem que mais trata com mau humor os jornalistas esportivos no Brasil foi nunca mais convocar os supostos culpados pelo desastre na Alemanha. Depois conseguiu de forma feia ganhar a Copa América de 2007, numa final contra um time muito superior, mas que não estava em um bom dia. Jogando no contra-ataque com Júlio Batista como craque do time ao lado de Robinho, estragou os planos da CBF de trazer Felipão. Não encantou nas eliminatórias, tomando sufoco de seleções inexpressivas, perdeu as Olimpíadas de forma humilhante para a Argentina, mas teve sorte na Copa das Confederações. Ganhou do Egito no último minuto. Precisou de um gol salvador no último lance do jogo contra uma África do Sul cuja a única qualidade era jogar em casa. Venceu os EUA na final e os resultados de Dunga se concretizaram com a classificação para a Copa.
Não gosto de Dunga nem como jogador, nem como técnico por achar que ele exerceu e exerce de maneira fraca as duas funções, aliado a sua arrogância de se achar o dono da verdade. O Brasil não vencerá a Copa de 2010. Por culpa exclusiva dessa pessoa. Jogadores de confiança se têm em clubes, na seleção, o próprio nome já diz, se seleciona os melhores para cada posição. Gilberto Silva é fraco, Josué, pelo amor de deus quem é esse indivíduo? Foi inventado e bancado pela imprensa paulista na época em que jogava no São Paulo. Doni é o segundo melhor goleiro brasileiro no mundo? Felipe Melo, Elano, Kleberson não jogam bem em seus clubes faz tempo. Além de Kaká, único armador dos 22 convocados, que está na pior fase da carreira e vive um drama com sua pubalgia difícil de se curar. Dunga diz que confia nesses jogadores que eles fizeram por merecer a confiança dentro de campo. Dizem que ele tem coerência em afirmar isso. Alguém, por favor, me indique em qual jogo e o que fez Josué para merecer ir para a Copa? Seu padrão de jogo é se fechar e sair rápido no contra-ataque. Seria louvável se dirigisse uma seleção sem alternativas, mas ele dirige o Brasil! Podemos contar com craques em qualquer posição, alguns afirmam e começam a montar o time do Brasil para 2014 com Neymar e Ganso, e outros craques da nova geração. Por que não os levamos para a Copa? Por que teremos que sofrer vendo o time jogando mal e rezar para Kaká melhorar, Robinho e Luís Fabiano estarem em um dia inspirado? Por que esse cidadão tem birra com Ronaldinho Gaúcho, que pode não estar numa fase exuberante, mas é melhor e pode decidir mais que qualquer um dos meio-campistas convocados pelo senhor zangão? Pobre torcedor brasileiro que confia nesse time. Infelizmente somente o tempo vai se encarregar de mostrar que ele está redondamente enganado. Para ganhar uma Copa, além de ser necessário um bom time é preciso ter sorte. Em apenas um mês se decide o campeonato, em apenas 7 jogos, e já que não temos um bom time...se existe uma cota para a sorte, ela já foi usada em outros jogos e torneios com o time de Dunga.

sábado, 3 de abril de 2010

Como os ídolos são tratados no Brasil

A novela envolvendo a renegociação de Petkovic no Flamengo nos faz relembrar daquela velha frase sempre dita em discussões sobre futebol: quem vive de passado é museu. Sempre usada para provocar algum torcedor rival que enaltece os grandes títulos do clube e que hoje está mal das pernas, a frase demonstra a falta de importância que o brasileiro dá a aqueles que fizeram muito pela história do país, por um setor da cultura ou nesse caso pelo futebol. Que Pet está mais velho é óbvio, a idade passa para todos nós. Que ele não é uma pessoa fácil de lidar como todos dizem, tudo bem, mas não é o único no Flamengo nem será o último no meio do futebol. Dizer que seu futebol acabou e o que vimos no último brasileirão foi suspiro final de um craque é pura especulação. Petkovic é um craque, já mostrou isso nos times que defendeu, marcou época como um dos maiores ídolos da história do Flamengo com o gol que ainda arrepia qualquer flamenguista quando vê a cobrança de falta do sérvio aos 43 do segundo tempo contra o Vasco no tri-carioca. Se não bastasse isso, Pet volta para o futebol em 2009 tido para muitos como jogador aposentado, negociado para acertar uma dívida que o clube ainda tinha com o gringo desde a sua passagem pelo clube em 2001. Resultado: é o melhor jogador do campeonato e leva o Flamengo ao sexto título de sua história, sendo o maestro do time e, na minha opinião, o jogador decisivo para o título. Mas como quem vive de passado é museu, nada do que ele fez para a nação rubro-negra conta nessa hora. Em um clube onde alguns podem tudo, sair do vestiário por ser substituído não é o fim do mundo, mas foi. Seja por vingança particular ou por puro desconhecimento do futebol , Marcos Braz queria Pet fora do clube. E ainda quer, pois não deixar que ele encerre sua carreira no Flamengo depois de tudo que ele significa para a torcida, perseguir o jogador dentro do clube e queimá-lo dentro de campo( que é o que tem sido feito) e querer que um ídolo da vasta história do Fla deixe a Gávea pela porta dos fundos é cruel e falta de reconhecimento. O Flamengo não é museu, mas seu passado e esses craques é que fazem o clube ser o que é. O clube não vai perder acertando a renovação de Pet. Mas uma coisa é certa: se ele sair, a torcida já sabe o que exigir dessa diretoria: LIBERTADORES É OBRIGAÇÃO!

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Direitos humanos para os humanos direitos

"Condenado por morte do menino João Hélio vai morar na Suíça

Ezequiel Toledo de Lima, um dos acusados de participação do assassinato do menino João Hélio Fernandes, de 6 anos, no dia 7 de fevereiro de 2007, já está na Suíça com a família. Ele foi solto no último dia 10 pelo juiz da Vara de Infância e da Juventude, que ainda determinou que Ezequiel ingressasse no Programa de Proteção à Criança e Adolescente, destinado aos que estão ameaçados de morte.

Ezequiel teria sofrido ameaças de morte no Instituto João Luiz Alves, onde cumpriu pena. A mãe do rapaz também teria sido ameaçada. Através da ONG Projeto Legal, ele conseguiu embarcar para a Suíça, com garantia de casa e identidade novas para recomeçar sua vida.

O menino João Hélio foi arrastado por cerca de sete quilômetros, depois de ter ficado preso pelo cinto de segurança do carro da mãe, após um assalto na Rua João Vicente, perto da Praça do Patriarca, em Oswaldo Cruz. Os bandidos abandonaram o carro na Rua Caiari, com o menino já morto."


A reportagem acima é de indignar qualquer ser humano direito e que cumpre seus deveres. Deveres, apenas isso que temos para com o Estado. Para termos DIREITOS nesse país é preciso cometer algum crime. Pode paracer exagero, mas pergunte se os direitos humanos dão alguma assistência aos pais e famílias devastadas e dilaceradas por Champinhas e Marginais como esses que mataram Joâo Hélio? Não. Agora para os crimonosos todos os direitos e nenhum dever. Nunca cumprem suas penas inteiras, acham brechas na lei. O Estatuto da criança e do adolescente beneficia apenas os adolescentes infratores. E vamos continuar assim, o caso de João Hélio que poderia ser uma bandeira e mudar essa situação no Brasil, foi mais um e outros viram e mais e mais, e nós vamos continuar pagando impostos e mais impostos para bancar esses infratores. A pergunta é uma só: A família de João Hélio terá uma chance de recomeçar a vida, sendo que ela foi a vítima e não a infratora?

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Garrincha x Pelé: a diferença de tratamento da mídia aos atletas e como isso influenciou suas carreiras

Introdução

Quem foi melhor Pelé ou Garrincha? Essa dúvida freqüente nas discussões dos amantes do futebol sempre esbarra no papel e interferência da mídia na carreira de um jogador. Mas será que esse fator pode ser realmente decisivo? Nos tempos atuais dos jogadores-celebridade, acompanhando a evolução da cobertura da mídia e do jornalismo esportivo sabemos que sim.
Com a transformação do esporte em fenômeno midiático, percebemos todo e qualquer jogador como um produto em potencial que vai atingir algum público alvo e se tornar um garoto propaganda. Garrincha e Pelé tiveram um tratamento diferenciado em sua carreira e isso foi fundamental para formação da imagem que perdura ate hoje sobre os dois ídolos do esporte nacional.

O esporte como fenômeno midiático

O futebol é considerado uma religião. Seu aspecto mítico contribui para que na nossa sociedade profana, ele seja o “altar”, onde o indivíduo vai realizar sua vontade de transcendência como em uma sociedade sagrada. É como uma válvula de escape, suas tristezas do dia a dia são esquecidas quando seu time do coração ou a seleção de seu país entra em campo. Através do jogo, países subdesenvolvidos e pobres se igualam aos desenvolvidos e ricos. Quando está assistindo a um jogo, o torcedor se “aliena”, se “transporta” para um outro mundo, cria no herói que está dentro de campo o seu sucesso, é como se ele tivesse vencido. Dessa forma, o ídolo gera uma relação de afinidade como o espectador e torcedor, sendo sua presença no jogo, decisiva para o sucesso do espetáculo.
A mídia, cada vez mais influencia no espetáculo esportivo. Antes, um torcedor precisava ir até à banca de jornal ou ir ao estádio para saber o resultado do jogo. Com o rádio, depois a televisão e hoje a internet, ele não precisa sair de casa para acompanhar toda a rodada do campeonato.
Não é à toa que a Copa do Mundo é o evento mais assistido do mundo, o futebol é um esporte televisivo. A presença da televisão é fundamental para o sucesso do esporte. É o que afirma NUZMANN (1996:15), presidente do Comitê Olímpico Brasileiro (COB)
...o Presidente do Comitê Olímpico Internacional COI, Marques Juan Antônio Samaranch ressaltou que os esportes que não se adaptarem à televisão estarão fadados ao desaparecimento. Da mesma forma, as televisões que não souberem buscar acesso aos programas esportivos jamais conseguirão sucesso financeiro e de público.

No Brasil, a televisão esteve sempre ligada ao futebol.
A unificação do país, por meio da TV, foi empreendida inicialmente pelo futebol; em seguida, veio a voga da telenovela (...) Moral da história: o futebol tem sido o veículo por excelência da expansão da videoesfera no Brasil. (MARQUES, 2005,p.149)

A televisão procura o tempo todo espetacularizar suas imagens para vendê-las e não é diferente com o esporte. Dessa forma o esporte passou a ser uma mercadoria e se tornou um show de entretenimento. A partir desse momento podemos analisar e entender qualquer atleta como um produto que pretende ser vendido, que quer ser visto como o melhor, e que todos, para serem tão bons quanto ele, devem ser como ele. Surgem assim, os grandes astros e celebridades do esporte: o fenômeno, o rei, o imperador, a atleta do século, o maior de todos os tempos em todos os esportes.
O futebol alimenta o imaginário do torcedor que através da mídia, se identifica com o jogador, o idolatra, construindo os mitos. A mídia e o esporte trabalham muito bem a formação e destruição do mito. A mídia tem a necessidade de produzir novas “mercadorias”. Portanto, cria mitos profanos, pessoas que têm uma aparência comum, de origem nas camadas populares que têm no esporte uma capacidade de ascensão social, gerando o consumo. Um consumo proporcionado pelo entretenimento que muitas vezes será feito pela paixão, tornando o consumidor mais influenciado pela marca ou organização que seu ídolo representa.
As grandes corporações passaram a investir no futebol, os craques do campo viravam garotos-propaganda de cigarros, bebidas, etc. Os clubes passaram a ter patrocinadores nas camisas, chegando hoje a terem departamentos de marketing e assessores de imprensa para garantirem a boa imagem dos atletas do time e do próprio clube. A afirmação do brasileiro João Havelange quando assumiu a presidência da FIFA, resume bem o que o futebol se tornava: “Vim para vender um produto chamado futebol.” Demonstrando que o esporte se tornou um fenômeno midiático.

A trajetória de Garrincha e Pelé

Na primeira vez que Garrincha apareceu na mídia, seu nome foi anunciado errado: Gualicho. Depois dos treinos de Garrincha no Botafogo, os repórteres correram para cima dele. O que se leu no jornal foi que um garoto de pernas tortas, tinha dado um “baile” em Nilton Santos, o melhor zagueiro do país.
Sandro Moreyra escreveu a matéria no Diário da Noite, afirmando que a jovem revelação do Botafogo se chamava Gualicho. Sandro tinha ouvido Garrincha falar seu nome, mas achou que não combinaria um nome de passarinho, com um jogador de futebol.
Não foi a primeira vez que Sandro inventou algo sobre Garrincha. Foi ele que afirmou que Garrincha chamava todos seus marcadores de “joão”. Uma mentira, mas que ajudava a reforçar a imagem de ingênuo de Garrincha. Sandro inventava as histórias e Mário Filho acreditava e publicava.
Sandro e Mário não calculavam que essas histórias seriam repetidas, deturpadas e que, com elas, estava criando o mito de um gênio infantil, e quase debilóide, que não fazia justiça a Garrincha. (CASTRO, 1995, p.261)

Até que o repórter Geraldo Romualdo da Silva, do Globo, encerrou as dúvidas com uma manchete em seis colunas com o título: “Meu nome é Manoel, mas meu apelido é Garrincha.”
Depois da primeira aparição, Garrincha continuou aparecendo na mídia como um driblador fantástico e um dos maiores pontas do Brasil. Na parte pessoal, foram várias as reportagens de Garrincha em seu “habitat natural”. Em Pau Grande, caçando passarinhos, sendo fotografado nas belíssimas cachoeiras, alimentando o mito de homem do campo. A cada reportagem reforçava-se a imagem da felicidade de Garrincha em seu bucólico universo.

Ele era puro, autêntico e outros adjetivos em voga. Sua casa era um casebre, mas ele não a trocaria nem pelo Taj Mahal.(...)Podendo ter todo os luxos e confortos de um campeão do mundo, preferia viver como um operário. Ou como um camponês.(CASTRO, 1335, p.232)

Sua imagem era de um homem do campo, ingênuo, que preferia o sossego da roça à agitação da cidade, que chamava seus marcadores de joão. Era como um plebeu, um homem do povo. Bem difícil de se comparar com alguém que detêm a imagem de “rei”.
A transformação de Garrincha em mito foi demorada. Nos seus primeiros anos de Botafogo foi criticado por driblar demais. Mas o clássico contra o Fluminense na final de 1957, foi decisivo para sua transformação em ídolo nacional e um dos nomes que não poderiam estar de fora na Copa do Mundo da Suécia.
Até o jornal francês L’Equipe, colocava Garrincha como titular absoluto. O jornalista francês Gabriel Hannot veio cobrir a preparação brasileira para a Copa e afirmou quando lhe perguntavam na França o que tinha descoberto no Brasil: “Maracujá e Garrincha”. Sua fama começava a se consolidar internacionalmente.
O Brasil tinha fama de “vira-latas”, um time que só ia para a Copa para aprender. A imprensa não acreditava no título em 1958, quanto mais após o empate contra a Inglaterra em 0 a 0, na segunda rodada da Copa da Suécia. E o próximo adversário seria a temível URSS.
No script para se ter um herói, precisamos de uma pessoa normal - como qualquer cidadão - que supera todas as dificuldades e conquista seu objetivo, salva uma população, um país. O que dizer de Mané? Ele não era normal. Se para uma pessoa normal já seria difícil fazer o que ele fez, imagine uma pessoa estrábica, com as pernas tortas, uma seis centímetros mais curta que a outra e que nunca tinha feito um exercício físico na vida até os 19 anos. Pois bem: ele superou o futebol científico dos russos e começou ali a idolatria ao menino de pernas tortas que conseguiu tornar uma Copa perdida em algo possível, colocou as pessoas nas ruas para comemorarem a vitória e se tornou a alegria do povo.
Nelson Rodrigues, em uma de suas memoráveis crônicas, credita a Garrincha o mérito maior de ter acabado, em duas Copas, com o complexo de vira-latas que amargurava o povo brasileiro.(NOGUEIRA, 2005, p.12)

No jogo seguinte, contra o País de Gales, Amaro, o pai de Garrincha, foi convidado pelo presidente Juscelino Kubitschek para acompanhar o jogo no palácio do Catete. Quando saiu, recebeu o agradecimento de Juscelino por tudo que seu filho estava fazendo pelo país. Foi nesse momento que Garrincha se tornou um herói nacional e se transformou em um mito, um herói midiático.
O Brasil conquistou a Copa e Garrincha consolidou de vez a sua imagem de herói e mito do esporte nacional. A chegada dos jogadores brasileiros foi triunfal, principalmente para os principais heróis do título: Garrincha e Pelé. “Eram como soldados que estivessem voltando, vivos e vitoriosos, da guerra da Coréia.” (CASTRO, 1995, p.183)
A conquista da Copa trouxe uma nova alma ao povo brasileiro, um sentimento de esperança de que mesmo um semi-analfabeto e pobre, poderia vencer. O mito de Garrincha se tornara mais forte, o povo via nele o espelho de uma possível mudança.
Garrincha começou a receber cartas de todas as partes do mundo. Pau Grande se tornou mundialmente conhecida. Um jornal francês soltou: “Brésil, capitale Pao Grande” Até o nome da cidade tentaram mudar para Garrincha, tamanha sua popularidade e fama. Garrincha logo recusou: “Onde já se viu? Pau Grande é um nome tão bonito.”
Waldir Amaral criou a imagem de vários jogadores durante a Copa que ele transmitiu pela rádio Continental. Garrincha recebeu o nome de “demônio das pernas tortas”, referindo-se ao inferno que Mané levava às defesas adversárias.
Garrincha foi o segundo jogador mais cantado da música brasileira, só perdendo para Pelé. Marchinhas de carnaval, sambas, tudo que falasse de Mané era certeza de sucesso.
O inventor do “Fair play”, um jogador muito disciplinado fazia justiça “à imagem que os cronistas haviam criado para ele: a do passarinho, a alma ingênua e alada do futebol.” (CASTRO, 1995, p.213). Alguns cronistas preferiam chamá-lo de anjo e outros de demônio. Mas sua imagem já estava mais do que consolidada.
Para provar isso, Garrincha venceu a eleição do jogador mais popular do Rio. A eleição foi promovida pelo Jornal dos Sports e Garrincha recebeu uma ajuda especial de Elza Soares, a grande sensação do samba nacional. Os dois apareciam juntos para conseguir votos, davam autógrafos e entre uma fotografia e outra Mané lançava seus olhares para Elza.
Mané reafirmou seu papel de herói nacional na Copa de 1962 no Chile. Sem Pelé, Garrincha fez de tudo e o Brasil voltou com o bicampeonato. Garrincha fez gol de falta, de cabeça, jogou pelas duas pontas, parecia um super homem, presente em todos os espaços do campo. Para quem tinha dúvida se ele era melhor que Pelé ou que era um jogador de uma jogada só, viu o “demônio” ou o “anjo” não precisar do “rei” para ganhar novamente a Copa. Mais uma vez aquele homem simples era o melhor do mundo, fazendo seu povo ter orgulho de ser brasileiro.
Após a Copa, Garrincha passou a ser o garoto-propaganda preferido das agências de publicidade. Fez comerciais para as “Lojas Ducal” e lojas de sapatos, onde até suas filhas com Nair apareciam.
Garrincha era um ídolo nacional e explorado pela mídia. Para os assessores de imprensa de hoje, seria um “prato feito”. Quem poderia sujar a imagem de um homem querido por todos, ingênuo, namorador, e que além de ter sido o herói em 1958, tinha ganho sozinho a Copa do Mundo de 1962, confirmando a hegemonia do futebol brasileiro no mundo? Naquele tempo, sem assessoria, podia sim e sujaram.
A imagem de Garrincha começou a mudar quando a imprensa tomou conhecimento do nascimento da sexta filha de Mané com Nair, sua esposa. A imprensa achou que Garrincha tentava desesperadamente ter um filho e era contemplado com uma filha atrás da outra. Foram feitas várias reportagens com Mané e suas filhas em Pau Grande. Ele brincava com elas, jogava bola, mostrando-se um pai carinhoso, o que realmente era, nas poucas vezes que ficava com elas. A imagem de um bom pai durou até 1962, quando o caso de Garrincha e Elza estourou na imprensa.
Elza alertava Garrincha sobre sua importância, dizendo que ele não poderia ganhar menos que Pelé. No Botafogo, Garrincha queria uma renovação com um contrato melhor, os dirigentes colocavam a culpa em Elza. O final do campeonato carioca se aproximava do fim e Botafogo e Garrincha não chegavam a um acordo. A imprensa não sabia ainda do romance, apenas informava que Garrincha estava discutindo o contrato com o Botafogo às vésperas do jogo decisivo contra o Flamengo. Alguns torcedores já passavam a hostilizar Garrincha. Mané decidiu jogar a final, ser campeão e depois negociar. Fez a melhor atuação de um jogador na história do Maracanã, marcou os três gols na vitória do Botafogo e foi bi-campeão carioca.
O contrato não foi renovado e as notícias da briga de Garrincha com o Botafogo estavam nas manchetes. Garrincha pediu seu passe ao Botafogo. Não lhe foi dado. O joelho de Garrincha já estava em estado crítico, não conseguia jogar partidas seguidas sem que ele inchasse. O Botafogo avisou que enquanto não jogasse, receberia o bicho pela metade. Foi então, que o caso Garrincha e Elza explodiu.
Como poderia um bom pai de família como ele abandonar a mulher com, então, sete filhas? Era como se Garrincha não tivesse tido nenhuma mulher antes e como se Elza tivesse destruído um lar que nunca existiu. A imprensa bombardeou os dois: Mané como irresponsável e Elza como destruidora de lares. Para alguns botafoguenses, Elza era flamenguista e queria destruir o Botafogo. O menino ingênuo e com alma de passarinho, deu lugar a um homem irresponsável que abandona o lar por causa de uma “aventura” amorosa. Porém, estava dando mais ibope do que falar o que todos sabiam: Garrincha vencera sua segunda Copa do Mundo para o Brasil. Venderia mais falar que um ídolo nacional estava envolvido num “escândalo” desse.
Toda a imagem de Garrincha, que estava destruída, poderia ser salva com dribles, gols e títulos. Afinal o que ele fazia fora de campo nunca teve importância, ele era um herói nacional por causa do futebol e não por ser um exemplo de bom marido. O maior problema de Mané foi seu joelho. Não conseguia jogar aquilo que sabia, com seu joelho em estado lastimável, a artrose era irreversível e só piorava a cada jogo de Mané. Portanto, o joelho, aliado ao álcool o impediu de refazer sua imagem e o que ficou, a partir desse momento, marcado em sua carreira foi sua vida pessoal.
“...o rito realiza o mito e permite a sua vivência. É essa a razão porque se encontram frequentemente ligados: na verdade, a união é indissociável e, de fato, a separação sempre foi a causa da sua decadência. Separado do rito, o mito perde, se não sua razão de ser, pelo menos o melhor da sua força de exaltação: a capacidade de ser vivido.” (CAILLOIS, 1972,pg.25)

O rito é o drible e Garrincha é o mito. A partir do momento que Mané não pode mais driblar como ele driblava, o mito perde a capacidade de ser vivido.
Nesse momento o mito passa a ser esquecido. Um novo mito chega para substituí-lo: o “rei” Pelé. Apenas sua vida pessoal passa a ser divulgada, o alcoolismo, suas dificuldades financeiras tudo isso vira notícia. Mesmo porque não se tem imagens das maravilhas que Mané fez em campo. Se não podemos recriar o rito através da imagem, o mito só será lembrado por quem viu Garrincha jogar e fazer o que fez.
Se Garrincha nunca mais tivesse jogado, o estrago em sua carreira teria sido menor. A lembrança mais recente seria dos seus dribles e dos títulos. Mas, a cada tentativa de volta, o joelho traía Mané e a imagem de um jogador que mal conseguia andar em campo foi substituindo a do “demônio” de pernas tortas. Não é à toa que Garrincha não tem seu devido valor na imprensa nacional. “Que Deus perdoe, nos meus ingratos colegas, o pecado de esquecer um dos maiores ídolos que a alma popular do Brasil tanto venerou no passado recente.”(NOGUEIRA, 2005, p.12)
Com o “esquecimento” de Garrincha pela mídia, Pelé passa a ser o único ídolo a ocupar as manchetes dos principais veículos de comunicação. Pelé, assim como Garrincha, estava envolvido no mesmo projeto de construção nacional.
Pelé, desde cedo sabia do seu potencial e seu diferencial. Garrincha era a imagem da redenção do povo brasileiro, que não se assusta perante o adversário( todos chamados de “joão”), que parte para cima mesmo tendo pernas tortas e uma difícil história de vida. (...)Os dois eram o exemplo de como os pretos, mestiços, humildes redimiriam o país de sua história de submissões e humilhações. Tratava-se de heróis próximos a grande parte da população, com os quais o povo poderia se identificar. (MELO, p.23)

A diferença começou no nome que dariam a Pelé, enquanto Garrincha seria o “anjo” ou “demônio”, Pelé seria o “rei”. Um rei ninguém discute, apenas reconhece seu reinado. Tudo que um rei faça, mesmo fora de campo não teria importância, afinal ele era um “rei” e nós “súditos” que podíamos apenas idolatrá-lo e cultuá-lo, mas nunca criticá-lo ou contestá-lo. Além disso, um “rei” é único, não pode haver outro, apenas um príncipe, que é inferior ao rei e quando o rei morrer pode tomar seu trono.
O primeiro a chamar Pelé de rei foi Nelson Rodrigues, nos anos 50. Nelson afirmava que Pelé tinha um porte de rei e isso o distinguia dos outros jogadores. “Quando ele apanha a bola e dribla um adversário, é como quem enxota, quem escorraça um plebeu ignaro e piolhento.”(CASTELLO, 2004,p. 195)
Pelé já se destacava no Santos com apenas 16 anos, tanto que jogou a Copa Rocca pela Seleção naquele ano. Com 17 anos era um dos nomes certos para a Copa do Mundo de 1958. Todos já falavam no menino como um “rei”. O nome dado por Nelson tinha pegado. Nelson também escreveu que somente um menino com o porte de rei poderia livrar o Brasil da fama de vira-latas.
Assim como Garrincha, Pelé voltou como herói da Copa do Mundo da Suécia. Marcou seis gols, sendo todos eles decisivos para o título do Brasil. A imagem de Pelé chorando copiosamente, abraçado ao sorridente Garrincha construía a nova dupla que lavou a alma do povo brasileiro.
No período entre as Copas de 1958 e 1962, Pelé se tornou um fenômeno. Foi campeão paulista três vezes, artilheiro de todos os torneios que disputou, fez o gol de placa no Maracanã e recebia o maior salário do futebol brasileiro. A Copa do Chile seria a consagração de um menino aos 22 anos de idade que já tinha conquistado quase todos os títulos que um jogador de futebol pode conseguir. É claro que se Pelé não fosse um gênio, o apelido de rei seria dito algumas semanas na imprensa e com suas fracas atuações seria esquecido. Mas como Pelé ia se superando a cada jogo, ia moldando a imagem de “rei”.
Até sua contusão na Copa do Chile é um fator que ajuda na construção da imagem de um herói. O herói sofre uma derrota grave, mas se levanta e consegue de novo seu objetivo depois de sofrer muito. Pelé queria ser bicampeão do mundo. Conquistou o título mundial pelo Santos em 1962 e em 1963.
Com a Copa de 1966, Pelé seria coroado de vez como o “rei”. Garrincha também foi convocado, marcou até gol na única partida que o Brasil venceu, mas já não era o mesmo. O Brasil fez sua pior campanha em Copas do Mundo, sendo eliminado na primeira fase. Pelé saiu reclamando da violência, dizendo que não jogaria mais uma Copa, isso aos 26 anos. Garrincha não teve a mesma sorte, não pode escolher se continuava ou não, seu joelho decidiu por ele.
Durante 1966 e 1970, Pelé consolidou sua imagem de “rei” no Brasil. Aparecia em todos os programas de TV, rádio, revistas. Foi o jogador mais cantado na música brasileira, e também o jogador mais filmado no cinema brasileiro. Tudo que falava sobre Pelé vendia e dava audiência.
Até que em 1969, Pelé marcou no templo sagrado do futebol, o Maracanã, o milésimo gol de sua carreira, de pênalti, contra o Vasco. Pelé logo pegou a bola e começou a beijá-la, sendo rodeado pelos jornalistas, dedicou o gol às criancinhas do país, pedindo para que elas não fossem esquecidas. O evento foi tão festejado, que alguns dizem que os fatos mais importantes daquele ano foram: o milésimo gol de Pelé e o homem chegar à lua.
A “coroação” definitiva do “rei” foi na Copa de 1970. Nela Pelé se tornou não só “rei” no Brasil, mas também o “rei” do futebol no mundo. Um time fantástico, cheio de craques, comandado pelo seu ex-colega de Seleção: Zagalo. Pelé marcou mais nessa Copa pelos gols que não fez. O chute do meio campo que passou rente à trave contra a Tchecoslováquia. Muitos jogadores já fizeram um gol como esse, mas o comentário é um só: ele fez o gol que Pelé não fez. A defesa do goleiro Gordon Banks, depois de uma cabeçada à queima roupa de Pelé, entrou para a história como a maior defesa de todos os tempos. E o drible de corpo no goleiro uruguaio e o chute para fora é lembrado como um dos gols mais bonitos que alguém não fez. Tudo isso sendo acompanhado pela primeira vez ao vivo, por todo o planeta, a cores. Pelé saiu da Copa como “rei” do futebol.
O título de rei foi levado tão a sério e tão bem construído que não foram poucas as vezes que Pelé foi visitar reis e rainhas de verdade em países europeus, sendo recebido com honras de chefe de Estado. Em qualquer parte do mundo que Pelé chega, todos querem vê-lo, é uma celebridade mundial. Até aqueles que nunca o viram jogar o idolatram, afinal um “rei” não se contesta, apenas se reverencia. Como o futebol é o esporte mais praticado do mundo, Pelé é um dos rostos mais conhecidos no mundo. O próprio Pelé afirmou em uma entrevista em novembro de 2005 que é mais conhecido do que Jesus Cristo.
Em 1980, Pelé recebeu o título de “atleta do século” na França e se tornou a personalidade esportiva mais importante do mundo.
Pelé sempre separou o atleta da pessoa. Em todas as entrevistas que concede, Pelé se refere a Pelé como se fosse uma terceira pessoa envolvida na conversa. É como se ele, o Edson, fosse uma pessoa e Pelé fosse outra. Outro fator que ajuda na imagem construída de Pelé. Tudo que puder manchar a imagem do “rei” na vida pessoal – como aconteceu com Garrincha - é facilmente limpo, pois quem fez foi o Edson. Pelé é só dentro de campo.
O jornalista Fernando Calazans, quando perguntado sobre quais os melhores jogadores da história do futebol, responde: “Pelé e Garrincha, ou até mesmo, como preferem alguns, Garrincha e Pelé. Só os dois - e pronto”(CALAZANS, 2005,p.39). Indagado sobre qual foi a melhor Seleção de todos os tempos, afirma: “Não foi a de 70. Simplesmente porque não pode haver seleção melhor de todos os tempos, nem no Brasil nem no mundo sem a presença de Garrincha. Ponto” (CALAZANS, 2005, p.49)
A Copa do Mundo de 1962 é a menos comentada pelos brasileiros. Para muitos o Brasil não fez mais do que sua obrigação de vencer pela segunda vez seguida. Foi uma seleção espetacular, com a mesma base de 1958, só que com uma experiência muito maior. Garrincha estava mais endiabrado do que nunca. Até o reserva do “rei” Pelé, Amarildo, se destacou. Muito se fala da Seleção de 1958, mais ainda da de 1970, mas muito pouco da de 1962. É claro que isso pesa quando vamos comparar a imagem de Pelé à de Garrincha. Justamente a Copa que Mané foi mais brilhante, que venceu sozinho, é a menos falada. Fala-se muito na que Pelé estreou e mais ainda na que ele se consagrou. Essa última é a mais comentada porque foi a mais vista. Foi a primeira a ser transmitida via satélite para todo o mundo, atingindo um número de espectadores muito maior do que as outras. As imagens eternizaram a conquista do Brasil naquela Copa.
O que faz um jogador ser o que é hoje é o acesso ao material que se tem dele. No Brasil até 1962, não existia vídeotape. Os filmes usados para registrar um jogo tinham oito minutos. Perdia-se muita coisa. Garrincha sofreu com isso, mas, em sua época, foi idolatrado por uma nação inteira, não resta dúvida. (CASTRO, 2005, p.37)

O jornalista Orivaldo Perin, afirma em sua matéria “A TV pereniza gênios e cabeças-de-bagre” que o torcedor desconhece os craques do passado por causa da ausência da televisão até meados dos anos 60. Perin fala exatamente das jogadas geniais dos grandes craques que ficaram perdidas, podendo ser registradas apenas por fotografia, pela emoção dos locutores de rádios e pelas crônicas esportivas.

Hoje, qualquer artilheirozinho tem seus gols e jogadas de efeito registrados em DVD ou disponíveis em arquivos de emissoras de TV. Quantos momentos geniais de Garrincha ficaram registrados só nas retinas dos que puderam vê-lo em campo? (...) Maradona , que os argentinos vêem como deus, surgiu na virada dos anos 70 para os 80, quando a TV já era senhora dos gramados. Trata-se de uma vantagem em relação aos gênios que brilharam antes deles.(PERIN, 2005, p.37)

Luís Mendes afirma que o papel da mídia foi fundamental nas duas carreiras.

E eu considero que se o Garrincha não foi melhor do que o Pelé, também não foi inferior. Só que o Pelé teve mais mídia. Juntaram-se os cariocas que não gostavam do Botafogo ou que torciam contra o Botafogo com os paulistas para fazer do Pelé o maior ídolo nacional. (MENDES IN VENÂNCIO, 2005)

Considerações finais

A primeira conclusão é a presença fundamental da televisão nos meios de comunicação. Tudo aquilo que você vê passa a ser mais real do que aquilo que você escuta ou lê e forma as imagens na sua imaginação. A televisão forma isso para você, da maneira que ela quer.
Garrincha foi um jogador da época do rádio como principal veículo de comunicação. Portanto, tudo que ele fez está apenas na memória ou na imaginação de quem viu ou ouviu. São poucos os lances que se tem sobre Mané. Já Pelé jogou durante a era do rádio, durante a transição para a televisão e foi um dos principais ícones para sua consolidação no país. Seus lances ficam eternizados nas imagens. Toda vez que alguém quiser saber quem foi o jogador Pelé, terá nos arquivos de televisão a possibilidade de reviver o mito do “rei” Pelé. Garrincha não.
Ao longo da pesquisa na realização do trabalho concluí que Garrincha foi melhor que Pelé. Dentro de campo ninguém nunca vai fazer o que Garrincha fez. Jogava o futebol da maneira mais pura possível, driblava por driblar, jogava por jogar e o gol seria uma conseqüência do seu show particular que encantava e fez as platéias do mundo inteiro rir. Jogava para encantar e fazer a alegria do próximo: do companheiro que recebia o passe para o gol ou do público. Garrincha foi um marco. Encerrou a era do futebol alegre, dos jogadores que não ficaram ricos, da beleza do jogo por si só, dos profissionais que bebiam antes dos jogos.
Pelé foi um atleta exemplar, um jogador espetacular, objetivo, que driblava em direção ao gol. O “rei” começou a era do futebol mais físico, da preparação, do resultado. Também foi um marco. Depois dele, o futebol virou um negócio que renderia bilhões de dólares. Foi o primeiro mito do esporte que a mídia fabricou.
Outro fator foi a eterna disputa de quem era o melhor. Não seria possível explorar a imagem de um jogador, como herói e símbolo nacional se não eram todos que concordavam que Pelé era o melhor ou Garrincha era o melhor. Um deveria ser o vencedor e como - para muitos - dentro de campo eles se equivaliam, outra forma de “desempate” deveria ser descoberta.
Foi preciso, então, que a vida pessoal de Garrincha começasse a aparecer na imprensa, como um desregrado, irresponsável, que deixava a mulher por uma cantora famosa. Enquanto a imagem pessoal de Pelé se mantinha intacta, já que ele próprio separava o Edson do Pelé. Só valia o que ele fazia em campo.
Como Garrincha não conseguia mais jogar, sua vida pessoal foi se sobrepondo à profissional, até que a dúvida sobre quem foi melhor fosse respondida da maneira que a mídia queria: ”Pelé”.
A mídia não soube ou não quis valorizar as façanhas de Garrincha e enaltecê-lo como ”rei”. Talvez porque ele fosse simples demais, despojado demais para envergar o manto e a coroa de um imperador. Além disso, para muitos que o conheciam era ingovernável, indisciplinado, recusava-se a aprender mais, a falar idiomas, não tinha perfil de “rei”. Seu “reino” era Pau Grande, onde, acreditava, tinha tudo o que precisava para ser feliz.
Mas, ainda que a mídia não pudesse ou quisesse coroá-lo, em qualquer tempo estará a lhe dever maior reverência por tudo que ele proporcionou aos torcedores do futebol e ao povo brasileiro, que ele alegrou com seus dribles, com seu riso maroto, com sua informalidade de menino, já que por muito menos muitos outros que vieram depois dele e de sua era são considerados celebridades e destacados como verdadeiros heróis nacionais.